quarta-feira, 5 de dezembro de 2012

O SIGNIFICADO DO NATAL


Todos os anos ao chegar o mês de dezembro, ganha destaque o chamado “espírito natalino”. As pessoas procuram ser mais amáveis, remetem cartões com lindas frases e se preocupam um pouco com os outros. Apesar de todo o processo de propaganda, da conotação quase que exclusiva ao aspecto externo, ainda é possível perceber que alguma coisa acontece nos níveis invisíveis. 

Existe certa influência energética, um “aroma” que traz paz, confraternização e harmonia. Os corações ficam mais dispostos, bem mais receptivos. É sensível a presença de uma força maior criando um clima favorável a um recolhimento interior. Não é difícil focar a mente em ideais tais como o amor e a fraternidade. 

Queiramos ou não o período do natal nos afeta e nos envolve. Mesmo quem não tem nenhuma tendência religiosa fica satisfeito, pois haverá motivo para um feriado ou para fazer uma festa. E na medida em que os anos passam o natal transforma-se cada vez mais em festas de mesa, dos sentidos e artifício para o comércio. Tudo isso em prejuízo do mundo do espírito. Diminui a preocupação ou a reflexão, como o seu verdadeiro sentido e a maior atenção é voltada para presentes, comidas e bebidas. Muitos animais são sacrificados com pretensa intenção de comemorar o nascimento de Jesus. Esquecem que a dor e a morte não são as melhores homenagens para o Mestre do Amor e da Compaixão. 

A rotina e a mera tradição não devem superar o conteúdo essencial desta data. Hábitos repetidos e ações condicionadas devem dar lugar à autenticidade. É importante compreendermos qual é o verdadeiro significado do natal, qual o sentido de toda essa simbologia e o que contém em si o maltratado termo “Feliz Natal”. 

O que se quer dizer quando se pronuncia para alguém “feliz natal”? Será que existe compreensão do que é feito? Será que há uma intenção real ou apenas repete-se por que os outros dizem? Para desejarmos feliz “alguma coisa” precisamos saber o que estamos desejando. É necessário um exame, uma maior reflexão. Seres conscientes e inteligentes devem fazer algo mais que copiar, repetir, seguir e perpetuar condicionamentos. 

Não tem sentido fazermos algo que não entendemos, repetir gestos e palavras sem conteúdo. Os atos conscientes possuem um maior poder. Por tudo isso é útil revisarmos nossos conceitos e nossos entendimentos, questionar o que é o natal, qual o sentido mais profundo para o tradicional “feliz natal”. 

Uma nova percepção deve ser alcançada examinando de que modo o natal pode ser algo vivo, um acontecimento novo a cada ano, um momento que traga vida e inspiração. Ao refletirmos com profundidade sobre o sentido do natal, veríamos que antes de tudo deveria ser uma grande festa para a Alma. Em vez de barulho, ceias e brindes alcoólicos, uma oportunidade especial para o silêncio, a reflexão e a meditação. É um dia para buscarmos a interiorização, uma maior conscientização, um renascer espiritual e um visualizar do novo ciclo. 

Como os antigos já diziam, a letra mata e o espírito vivifica. Não devemos esquecer que as religiões falam por símbolos e que os textos bíblicos foram escritos através do uso de alegorias, parábolas, metáforas e com uma Linguagem Simbólica. Sem dúvida existe um grande significado, um profundo conteúdo místico e não relatos históricos. Por que tornar concreto o que é abstrato? Por que tentar tornar história o que é misticismo? 

O foco da atenção deve estar na busca de um significado para a narrativa apresentada. Deve ser feito um exercício hermenêutico, uma interpretação viável para os símbolos. Além disso, cabe questionar se existe algum sentido em usar pinheiros cobertos com neve para nós que vivemos numa região tropical. Caía neve na Palestina ou isso foi um acréscimo feito pelos europeus, séculos depois, já que em muitas regiões da Europa as árvores, nessa época, são cobertas por flocos de neve? Não fica nítido que foram os colonizadores europeus que espalharam essa tradição pela América, até mesmo como uma maneira de lembrar a terra dos antepassados, que está em pleno inverno ao final do ano? É necessário cortar árvores e enfeitá-las ou é melhor uma comunhão com a Natureza? 

O aspecto central do natal deve estar ligado ao significado do interior, conectado com um reto entendimento. Para chegarmos ao seu real significado, devemos fazer um exame a partir de cinco ângulos distintos: 

- Histórico (“Nascimento” de Jesus) 

- Astronômico (Nascimento do Sol – solstício de inverno) 

- Simbólico (o “Nascer”) 

- Místico (o Nascer do Cristo em nós) 

- Ecológico (o Nascer do Cristo na Natureza) 

No geral, o natal é tomado como sendo uma comemoração do nascimento de Jesus. Porém, há uma grande confusão entre os termos “Jesus” e “Cristo”. Jesus é o homem, Cristo é o Espírito que se manifestou em Jesus após o “batismo”, aos 30 anos. G.R.S. Mead, um exímio pesquisador do Cristianismo Primitivo, em “Fragmentos de uma Fé Esquecida” fala-nos que no Cristianismo Gnóstico é bem conhecida a grande distinção entre Jesus e o Cristo. Nesta obra há tradução dos “Atos de João”, onde numa passagem é relatado um diálogo entre Jesus e o “Senhor”, que foi “assistido” por Pedro, João e Tiago. [1] Mead acrescenta que em sua opinião, baseada nos textos gnósticos, “o Cristo foi o Grande Mestre, Jesus foi o homem através de quem Ele ensinou durante o tempo do ministério”.[2] 

Se lermos com atenção uma boa tradução da Bíblia (“Setenta”, “King James Bible”) veremos que a maioria das referências são feitas a Jesus, o filho de Maria. Um número bem menor falam de Jesus Cristo (ou “Jesus, o Cristo”), o “Espírito do Senhor”. O teósofo Geoffrey Hodson ao comentar a simbologia do Novo Testamento, no importante trabalho “The Christ Life from Natiivity to Ascension” destaca que “a palavra Cristo, a qual foi acrescentada como um segundo nome” não é um nome pessoal e “sim uma descrição de um estado de consciência”.[3] Hodson diz que a “história da vida de Jesus do tempo do seu Batismo em diante revela que, na verdade, ele foi em todo respeito e numa maneira completa um Consagrado – assim seu nome, Jesus Cristo”. [4] Desse modo, existe dois nascimentos: o de Jesus (o homem) e o do Cristo em Jesus. Já teremos aí dos significados para o natal. E muito material para ser analisado e estudado. 

Após uma pesquisa minuciosa, verifica-se que não existe base histórica para afirmar-se que Jesus nasceu no dia 25 de Dezembro. Além de o calendário atual ser muito distinto dos anteriores, a celebração religiosa que ocorre nessa época já existia antes do surgimento do Cristianismo e é sabido, como veremos a seguir, que foi no século IV d.C. que se passou a considerar esta data como nascimento de Jesus. 

Séculos antes os egípcios já realizavam, nessa época, grandiosos cerimoniais nos quais homenageavam o Sol – símbolo da Luz Espiritual. Eles veneravam a “Consciência” que com sua luz iluminava e infundia o seu poder sobre todas as almas. Existia um forte sentido simbólico. Cerimônias semelhantes eram feitas pelos incas, astecas, caldeus, comunidades gregas, nos cultos de Mitra. E, curiosamente, esses povos, com diferentes religiões, tinham suas celebrações no mesmo período do ano. 

Em todas as religiões, no seu aspecto externo (exotérico), ocorreu uma antropomorfização do Sol. O Sol Oculto e invisível, do qual o visível é uma reflexão, sempre foi o emblema da divindade. Os cultos de adoração ao Deus-Sol, no Peru, são bem conhecidos na história. Mitra, a antiga divindade persa, era um Deus-Sol, o dispensador da luz. Também nos Vedas encontra-se Mitra, uma das doze personificações do Sol. Ainda na tradição oriental Sûria é o Sol. Na Grécia e em Roma existiam festas em homenagem ao Sol. 

Fica claro que a celebração feita ao final de dezembro não é uma posse exclusiva do Cristianismo, mas uma comemoração mística existente em todas as grandes religiões. Na antiga Religião Egípcia o Sol era o símbolo do divino por excelência, sua luz era considerada uma manifestação visível de Deus. Osíris era chamado “Alma do Sol” e o sol nascente era personificado em Hórus. Cornélio de Lápide no “Sermão sobre a Santa Virgem” escreve que as seguintes palavras foram ditas por São Bernardo referindo-se à Virgem Maria: “O Sol-Cristo vive em ti e tu vives nele” (I,431). [5] 

Não há diferença, em seu sentido interno, entre os termos destacados – “Sol-Cristo” e “Sol-Osíris” – pois é a mesma ideia, é o mesmo Deus-Sol. Na nomenclatura cristã o Verbo (o “Logos”), como vemos no início do evangelho de João, tem por símbolo o Deus-Sol. O Cristo místico é o Logos descendo a matéria. Assim, Jesus foi identificado com a Segunda Pessoa da Trindade, tornando-se o Cristo místico, a luz dos homens. 

É útil examinarmos a origem dos termos “Cristo” e “cristãos”, para percebermos melhor o sentido real do “nascimento” do Cristo. A palavra “Cristo” é anterior ao Cristianismo. Clemente de Alexandria na “Stromata” comenta que aqueles que acreditam em “Chrêst” são chamados “Chrêstians” (S,II) e Justino Martyr, em sua “Apologia” chama os cristãos de “Chrêstians”. Outro autor e comentarista, Lactancio, diz que é “apenas por ignorância que as pessoas se chamam de cristãos ao invés de Chrêstians”.[6] 

H.P. Blavatsky, fala-nos do uso do termo “Christo” pelos gregos e no trabalho “O caráter Esotérico dos Evangelhos” ela explica que a palavra “Chrêstos” existia muito antes do Cristianismo e que os termos Cristo e cristãos eram originalmente grafados “Chrêst” e “Chrêstians” [7], tendo a sua origem na terminologia dos Templos Pagãos. Durante vários anos os primeiros seguidores da nova religião chamam-se “nazarenos” e não “cristãos”. Blavatsky cita Canon Farrar, que no livro “ The Early Days of Crhistianisty” explica que o nome “cristãos” só passou a ser usado após a perseguição de Nero. 

G.R.S. Mead cita que os gnósticos marcionistas tinham uma igreja na Síria, a qual estava dedicada para “o Senhor e Salvados Jesus, o Bom- Chrêstos e não Christos”. Segundo mead, nos primeiros tempos parece ter existido muita confusão entre os dois títulos. “Christos é o termo grego para o hebraico Messias, o Ungido. O título Chrêstos foi usado para alguém Santo ou Perfeito”. Sem dúvida, “aqueles que mais tarde adotaram os textos, em pura ignorância, mudaram Chrêstos para Christos”.[8] 

O pesquisador Gerald Massey, em sua obra “Paulo, o Oponente Gnóstico de Pedro”, mostra que o “Christos” de São Paulo não era Jesus. Mas sim o “Cristo do Mistérios”, o Princípio Divino em cada ser humano. Os “Chrêstians” buscavam despertar da consciência espiritual, referido por São João ao dizer “aquele que não nascer de novo, não pode ver o Reino de Deus”. Segundo Geofrey Hodson, “na antiga Grécia o termo Christos, o Consagrado (ungido), foi aplicado para aqueles que tinham sido admitidos em certo grau dos Mistérios Maiores”.[10] É isto o que significa a simbologia do nascimento de Jesus em uma “gruta”. Foi seu primeiro grande passo na caminhada em direção ao Reino dos Céus, sua recepção na Comunhão dos Santos. 

Os estudiosos do cristianismo original e dos textos gnósticos indicam que Jesus viveu entre os Nazarenos e Essênios alguns anos antes da chamada “era cristã”. Recentes documentos encontrados, a partir do ano de 1947, conhecidos como “Papiros do Mar Morto”, demonstram a realidade da afirmação de que Jesus foi um instrutor entre os Essênios, tendo vivido numa comunidade à beira do Mar Morto que foi atacada ao final do século I a.C. 

Autores estudiosos como Annie Besant, Gerald Massey, C.W. Leadbeater, Geofrey Hodson, Blavastky, G.R.S. Mead, atestam que nosso calendário nasceu em torno de um século antes do chamado “ano zero” de nosso calendário e que nas passagens geralmente censuradas do “Midrashim” e do “Talmud” pode-se encontrar dados de uma história autêntica. Ali se encontra o relato da vida de Jeschu Ben Pandera – verdadeiro nome de Jesus – sendo que as melhores informações sobre este assunto estão nos livros “Did Jesus Live 100B.C.” [11] de G.R.S.Mead e em “Ísis sem Véu” de H.P.Blavatsky. 

Nos primeiros séculos da era cristã usou-se muitas datas na tentativa de se localizar o dia do nascimento de Jesus. Os primeiros padres da igreja, entre eles Clemente de Alexandria, procuravam localizar uma data aproximada, já que seria quase impossível descobrir qual o dia exato. Epifânio cita grupos cristãos que celebravam a vinda de Jesus ao mundo em junho e julho. Clemente faz uma referência a novembro. Outros apontam abril e maio, que é a época mais provável, correspondente ao período da primavera no hemisfério norte. O bispo C.W.Leadbeater diz, no livro “The Inner Side of Christian Festivals”, que “a real data do nascimento de Jesus não é conhecida, mas por várias indicações parece provável que isto foi em algum momento da primavera.” [12]. Williamson no livro “Great Law” comenta: “Todos (“?”) os cristãos sabem que 25 de dezembro é, agora, a festa do nascimento de Jesus, mas poucas pessoas sabem que nem sempre foi assim. Cento e trinta e seis (136) datas diferentes foram escolhidas por diversas seitas cristãs” [13]. 

Annie Besant na obra “O Cristianismo Esotérico” elucida muitos aspectos do lado místico e simbólico do Cristianismo. A autora mostra que o dia 25 de dezembro foi escolhido pelo Papa Júlio I, no século IV, para ser a data comemorada. Foi um decreto papal o instrumento usado para superar o impasse até hoje não solucionado. Leadbeater comenta que o dia 25 de dezembro foi selecionado da primitiva história eclesiástica “porque coincidia com o grande festival do Sol” [14] e que foi naturalmente conveniente tomar vantagem de uma celebração pública já existente. 

Outro especialista sobre as origens do Cristianismo, o Dr. Alvin Boyd Kuhn, em seu livro, “A Rebirth for Christianity” nos fala que “em 345 d.C. uma encíclica emitida pelo Papa Júlio (*) decretou o deslocamento da data do natal de 25 de março para 25 de dezembro, com a expressa afirmação de que esta medida foi tomada para alinhar a celebração cristã do nascimento do Salvador com o costume dos seguidores de Baco e de Mitra que comemoravam o nascimento da Divindade no solstício de inverno”. [15] Portanto, é um reconhecimento oficial em relação ao fato de que a celebração do natal é anterior ao nascimento de Jesus. 

O cristianismo, do mesmo modo que as outras grandes religiões, foi fundado no hemisfério norte, tendo suas datas relacionadas àquele hemisfério. 

(*) Na edição de 1970 aparece Julio XI. Besant cita Julio I. 

Em “The Inner Side of Christian Festivals”, encontramos que o renascimento do Deus-Sol ocorria após o solstício de inverno, sendo que a Terra atingia um ponto de reinício de sua órbita ao redor do Sol. O autor acrescenta: “aqueles que não reconhecem o significado simbólico da vida do Cristo naturalmente supõem que todas essas comemorações eclesiásticas são meramente históricas”. [16] 

São Crisóstomo, em 390 d.C., num trecho citado por Besant, disse que “este dia”, 25 de dezembro, em Roma, acaba de ser escolhido como o nascimento de Cristo, a fim de que os pagãos, ocupados com suas cerimônias, deixem os cristãos celebrar seus próprios ritos sem ser molestados. [17] Os “pagãos”, aqui referidos, são os outros povos e suas religiões. E eles não molestavam os cristãos, já que suas celebrações eram anteriores. Outra passagem semelhante encontramos na obra “The Gnostics and Their Remains” de C.W. King, que destacou: “a antiga festa celebrada a 25 de dezembro, em honra do nascimento do Ser Invencível, e assinalada por grandes jogos no circo, cuja data certa, como confessam numerosos Padres da Igreja, era então, como hoje, desconhecida”. [18] 

Na obra “Decadência e Queda do Império Romano”, de Gibbon, lemos que “os romanos (cristãos), tão ignorantes como seus irmãos com relação à data do nascimento do Cristo, escolheram, para festejá-la, o 25 de dezembro, no momento das brumélias do solstício de inverno, nas quais os pagãos celebram cada ano o nascimento do Sol”. [19] Como vemos, são vários os autores que mostram a data do “natal” sendo adaptada ao solstício. Destaco outra colocação clara do bispo Leadbeater: “Estes festivais do Deus-Sol tinham sido preservados por milhares de anos antes do nascimento de Jesus”. [20] 

Foi, pois, após o século IV que os “cristãos” passaram a celebrar o nascimento do “chrêstos”, o Espírito Divino, o Deus-Sol, do mesmo modo como faziam os chamados pagãos – egípcios, caldeus, gregos, hindus, astecas e vários outros povos. Em termos astronômicos, todos festejam o solstício de inverno, assim como a Páscoa tem relação com o equinócio de primavera no hemisfério norte. 

Segundo o “Glossário Teosófico” de H.P. Blavatsky é provável que o solstício de inverno coincidisse primitivamente com o 25 de dezembro, mas que devido à precessão dos equinócios ocorre uma antecipação da hora do solstício anualmente. Blavatsky cita o escritor Emílio Burnouf, que no livro “A Ciência das Religiões”, diz que o culto cristão está distribuído segundo a marcha do Sol e da Lua e que o solstício de inverno no hemisfério norte está ocorrendo antes do dia citado. Hoje, se fôssemos ser fiéis ao aspecto astronômico, teríamos que celebrar o nascimento do Cristo místico no dia e no momento exato da posição do Sol. No ano de 1983, como exemplo, isto aconteceu às 10 horas e 31 minutos do dia 22 de dezembro, horário de Greenwich. Após o solstício, a Terra em seu movimento em torno do Sol, atinge a sua menor distância em relação ao Sol. Em termos místicos significa que com o nascimento do Cristo a luz aproxima-se mais dos homens. 

Apesar do nascimento de “Jesus, o Cristo” no dia 25 de dezembro não ser um evento histórico, não devemos negar a importância mística e religiosa de lembrarmos o nascimento de um Grande Instrutor. Certamente terá um intenso efeito espiritual voltarmos o pensamento em direção ao Mestre Jesus. E, certamente, não pretendemos mostrar que o natal é um mero acontecimento astronômico. Esses dois aspectos, reunidos ao simbolismo e ao misticismo inerentes à ideia do nascimento do Cristo no coração dos homens, nos levarão a uma maior percepção do significado mais profundo, no qual o natal passa a ser visto como um grande Rito Cósmico, o qual harmoniza as forças espirituais do macro ao micro e microcosmos. 

Como constantemente destaca Geoffrey Hodson, não podemos esquecer que toda narração bíblica possui nitidamente um caráter alegórico e que as etapas representadas por Jesus no texto são uma demonstração da jornada evolutiva da alma humana. Em “The Hidden Wisdom in the Holy Bible” o autor nos indica que a primeira chave para se interpretar as escrituras cristãs é tomar os relatos externos – pretensamente históricos – como acontecimentos interiores (subjetivos). Também Orígenes, o sábio cristão de Alexandria, realça que os textos bíblicos contém um “corpo, uma alma e um espírito”. Não devem ser tomados no seu sentido literal e sim assimilados a partir de seus níveis mais internos, usando-se a Gnose, instrumento indispensável para a compreensão real do sentido alegórico. A Bíblia é um texto inspirativo. Seus autores nunca pretenderam criar uma fonte de fatos históricos. 

Nos ensinamentos de todas as grandes religiões existe a ideia da necessidade de “nascer de novo”, “ser iluminado”, “despertar” para outro nível de consciência. E sempre que isto acontece, brilha uma Estrela, símbolo do Homem Perfeito. É a presença invisível de Melquisedec, o supremo sacerdote de Deus na Terra, o Rei dos Reis, junto àquele que está sendo recebido na Comunhão do Santos, no Reino dos Céus, por ser ele o chefe da grande Ordem Espiritual no planeta. Este passo é sempre representado como um nascimento é a recepção da “criança” (símbolo da pureza) em um novo mundo. 

A alegoria do nascimento de Jesus em uma “gruta”, ou em uma “caverna”, é o despertar da Alma, é o nascimento do Cristo interno, da Divindade presente nos corações dos homens. É o surgir da luz que dissipará as trevas. Em outra linguagem, diríamos que é na cavidade do coração que brota a Rosa que irá ser o centro da Cruz. Deste modo, o nascer do menino Jesus, na festa do natal, é símbolo do despertar da consciência crística. 

São Paulo, que viveu depois de Jesus, nos relata que ele conheceu o Cristo quando foi arrebatado ao terceiro céu. Diz ele: “Conheço um homem em Cristo que, há quatorze anos foi arrebatado ao terceiro céu... E sei que esse homem foi arrebatado até o paraíso e ouviu palavras inefáveis, que não é lícito ao homem repetir”. [21] Era dessa experiência interior que ele retirava sua convicção para dizer que “Cristo em vós, é a esperança de glória”. 

Esta perspectiva nos mostra que o natal é algo sempre atual, uma comemoração no presente e não mero lembrar do passado. É uma celebração interior, com vida e energia transformadora. Deve ser uma abertura do coração do homem para o coração do mundo. Sem dúvida o natal deve ser uma grande festa, mas uma festa para a Alma e a Natureza. Após toda uma preparação nos reinos invisíveis e nos mundos espirituais, e após o instante do solstício, todo o planeta recebe uma grande efusão de energia. 

Por esse motivo, é correto considerar o natal como um Rito Cósmico e Ecológico, no qual podemos participar ativamente, tendo como centro o harmonizar-se com o todo e não apenas desejar receber. É importante estarmos abertos e receptivos, ao mesmo tempo em que procuramos contribuir com nossa força interior, ofertando bons pensamentos e criando um clima de paz e fraternidade. Há uma maior possibilidade de um despertar da consciência, pois bênçãos superiores infundem-se sobre a humanidade. Cristo nasce na Natureza, pois o natal não é apenas o nascimento simbólico do Sol. Em seu aspecto energético, é o nascimento do Cristo imanente na Natureza. 

A teósofa Dora Van Gelder* em seu pequeno, mas sábio trabalho “O Natal dos Anjos” esclarece inúmeros pontos obscuros. Ela explica que “o principal propósito da festa de Natal é o nascimento do Cristo no mundo da Natureza” e que o Natal “é uma época de enorme atividade no reino angélico” [22]. Todo o reino Dévico dirige sua atenção a este evento, pois o Senhor Cristo é o Instrutor dos Anjos e dos Homens. Os Anjos ou Devas como são conhecidos no Oriente, são agentes ativos do Cristo na Natureza. O natal marca uma renovação e uma mudança das forças negativas e positivas que equilibram a vida oculta do planeta. 

*Dora Kunz – Presidente da Seção Americana da Sociedade Teosófica e Diretora do Centro Olcott, Wheaton, Illinois. 

Essa efusão de forças espirituais produz uma vivificação da Natureza visível e invisível. Após uma enorme atividade e trabalho de preparação, chega-se ao natal, “exatamente depois do dia mais curto do solstício de inverno, no hemisfério norte, enquanto no hemisfério sul é celebrado depois do dia mais longo do solstício de verão” [23]. Busca-se um nível de equilíbrio. Correntes de força dirigem-se do Norte para o Sul e do Sul para o Norte. A autora ainda nos indica que todo esse movimento de forças, que começa bem antes do natal e que tem seu clímax no final de dezembro, tem dois aspectos: “Enquanto no Hemisfério Norte tem lugar um verdadeiro nascimento no Natal, no Hemisfério Sul o que ocorre é antes um aprofundamento da vida... No norte, alegria, amor e beleza são as influências predominantes; no Sul são derramados poder e força – um verdadeiro aprofundamento do Cristo na Natureza... Um é a elaboração de baixo para cima (“ Espírito Santo”), o outro, um verter de cima para baixo (uma verdadeira descida do Filho) “ [24]. 

Com essa visão o natal transforma-se em uma esplendorosa festa nos mundos interiores. E é devido a essa influência que o “clima de natal” manifesta-se entre nós. Sem dúvida, é uma grande comunhão ecológica, que cresce de importância a cada ano devido ao desequilíbrio do planeta, às guerras e à imensa poluição ambiental. Só isto nos mostra a importância de nos conscientizarmos da realidade invisível deste momento e de colocarmos, com boa vontade, todas as nossas capacidades nesta celebração, aliando-nos ao majestoso e divino trabalho realizado pelo Reino Angélico. A vida e o equilíbrio do planeta necessitam da colaboração de todos, pois o mundo é um reflexo da ação dos indivíduos. Não há lugar para se manter a rotina das festas de fim de ano ou o desconhecimento do que realmente acontece ao final de dezembro. 

É ainda Dora Van Gelder que comenta a cerca da onda de vida que se espalha por todos os quadrantes. Isto mais uma vez torna nítido o caráter universal do natal. Durante o dia de natal a terra pulsa e vibra com as ondas de adoração que vão ao Senhor, provenientes das incontáveis hostes de Anjos pelo mundo afora e pelas meditações e orações sinceras. Em resposta às invocações e às adorações movidas pelo espírito de paz e confraternização, Cristo, auxiliado pelos seus agentes, derrama bênçãos de paz para toda a humanidade. 

Tudo isto nos transmite uma nova compreensão e uma vontade de vivenciar esse ritual Ecológico. O natal é um momento especial para os homens abrirem seus corações à luz espiritual, da qual o Sol é o símbolo físico, para que o Cristo interno, “a esperança de Glória”, nasça em cada um, produzindo um novo viver. Felizes daqueles que estão disponíveis para tal oportunidade, pois certamente sentirão o que realmente significa um “Feliz Natal”. 

Alberto Brum de Souza


Fonte: http://ebookbrowse.com/o-significado-do-natal-alberto-brum-de-souza-2-doc-d142830303
Fonte da Gravura: https://pixabay.com/pt/vectors/lua-silhuetas-papai-noel-renas-31665/


Referências 

Este trabalho procurou reunir uma série de dados, a partir de autores que no nosso entender dão as informações mais valiosas para uma percepção do real significado do Natal. Indicamos abaixo as fontes, para um estudo mais detalhado: 

Dora Van Gelder – O Natal dos Anjos, Sociedade Teosófica, Rio de Janeiro, 1979. 

Annie Besant – O Cristianismo Esotérico, Pensamento, São Paulo, 1964. 

C.W.Leadbeater – The Inner Side of Christian Festivals, The Saint Alban Press, Ojai, Usa, 1973. 

Alvin B. Kuhn – A Rebirth for Cristianity, TPH, Wheaton, 1970. 

H.P. Blavatsky – Isis Sin Velo, Editorial Eyras, Madri, 1977. 

H.P. Blavatsky – O Caráter Esotérico dos Evangelhos (em A Doutrina Oculta), Hemus, São Paulo, 1977. 

H.P. Blavatsky – Glosario Teosofico, Kier, Buenos Aires, 1957. 

G.R.S. Mead – Fragments of a Faith Forgoteen, TPS, Londres, 1906. Reedição: University Books, New Work, 1972. Venda: Philosophical Research Society, Los Angeles, California. 

G.R.S. Mead – Did Jesus Live 100 B.C.?, TPS, Londres, 1903. Reedição: University Books, New Work, 1968. 

G.S.R. Mead – The Hymn of Jesus, TPH, Wheaton, 1973. 

Geoffrey Hodson – The Christ Life from Nativity to Ascension, TPH, Wheaton, USA, 1975. 

Geoffrey Hodson – The Hidden Wisdom in the Holy Bible (vol.I), TPH, Adyar, India, 1963. 

Geoffrey Hodson – O Reino dos Deuses, Pensamento, SP, 1982. 

Geoffrey Hodson – A Fraternidade de Anjos e de Homens, Pensamento, São Paulo, 1982. 

Geoffrey Hodson – O Lado Interno do Culto na Igreja, Pensamento, São Paulo, 1983. 

Geoffrey Hodson – Os Anjos e a Nova Raça, Sociedade Teosófica, Rio de Janeiro, 1981. 

Robert S. McGinnis Jr. – The Essenes in Esoteric Perspective, American Theosophist, Wheaton, 1977. 

James M. Robinson (editor) – The Nag Hammadi Library, Harper-Row, New Work, 1981. 

Alvin B. Kuhn – The Lost Key to the Scriptures, The Theosophical Press, Wheaton, 1966. 

Charles Francis Potter – The Lost Years of Jesus Revealed, Gold Medal Books, Fawcett Publications, Usa. 1958. 

The Holy Bible, King James Version (1611), New Work, 1980. 

Obs.: TPH – Theosophical Publishing House / TPS – Theosophical Publishing Society 


Notas 

[1] G.R.S. Mead – “Fragments of a Faith Forgoteen”, TPS, Londres, 1906. 

[2] Idem, p.430. 

[3] Geoffrey Hodson – “The Christ Life from Nativity to Ascension”, TPH, Wheaton, p.34. 

[4] Idem, p.35. 

[5] Blavatsky – “Glosario Teosofico”, Kier, Buenos Aires, p.742. 

[6] Blavatsky – “Doutrina Oculta”, Hemus, SP, p.163. 

[7] Idem, p. 173. 

[8] G.R.S. Mead – “Fragments of a Faith Forgoteen”, TPS, Londres, 1906, p. 249. 

[9] G. Hodson – “The Christ Life from Nativity to Ascension”, TPH, Wheaton, USA, 1975, p. 35. 

[10] Idem, p. 34. 

[11] TPS, Londres, 1903 (ver referências) 

[12] Saint Alban Press, Ojai, (Usa), 1973, p.9. 

[13] Alvin B. Kuhn – A Rebirth for Christianity, TPH, Wheaton, 1970 

[14] Leadbeater – “The Inner Side of Christian Festivals”, p.9. 

[15] Alvin B. Kuhn – “A Rebirth for Christianity”, TPH, Wheaton (Usa) p. 122. 

[16] Leadbeater – Saint Alban Press, p.9. 

[17] Annie Besant – “O Cristianismo Esotérico”, Pensamento, São Paulo, p.91 

[18] Wizards, San Diego, 1982. 

[19] Annie Besant – “O Cristianismo Esotérico”, Pensamento, São Paulo, 91. 

[20] Leadbeater – “The Inner Side of Christian Festivals”, p.9. 

[21] Coríntios – II, 12: 1-4 

[22] Sociedade Teosófica – RJ – 1979, p.11. 

[23] Idem, p.6. 

[24] Idem, p.9.