sexta-feira, 29 de julho de 2022

A DOR É CONDIÇÃO DE APOIO


Aceitemos realmente a dor na condição de apoio celeste com que a Divina Providência nos enriquece o caminho.

Toda a natureza para ajudar a experiência do homem, alimentando-o e amparando-o, padece constantes dilacerações.

Para transformar se em sementeira proveitosa, morre o grão esquecido no solo.

Para converter-se a espiga em farinha, humilha-se, asfixiada, sob a mó que a tritura.

Para dar-se em pão abençoado à mesa, submete-se a farinha à elevada tensão do forno.

Para servir no levantamento do edifício, sofre a pedra a pressão do martelo.

Para oferecer se em beleza e brilho, obedece o seixo bruto ao buril que o aprimora.

Para responder às necessidades do conforto, desce o tronco aos insultos da lâmina.

Para contribuir no progresso, encontra o metal as injúrias do fogo.

A responsabilidade na oficina do caráter, é luz que engrandece todo espírito que lhe atende as obrigações.

Não lamentes a dificuldade e nem amaldiçoes o sofrimento que porventura te busquem.

Não temas a dor, na escola da vida, e recolhe, em silêncio, as bênçãos de que se faz emissária.

Não te enganes com as aparências.

Quando te vejas no usufruto dessa ou daquela promoção, atento às circunstâncias do mundo, às imposições dos que te cercam ou às convenções em que a existência se te condiciona, escolhe a senda da abnegação, em auxílio aos outros, porque o Senhor nos ensinou, em espírito e verdade, que somente a preço do esforço máximo pela vitória do bem com o esquecimento de todo egoísmo, é que escalaremos o monte da paz com a nossa própria renovação.



Francisco Cândido Xavier / Emmanuel




Fonte: do livro "Nascer e Renascer"
Fonte da Gravura: https://pixabay.com/pt/illustrations/rocha-bola-luta-empurre-homem-3650793/

domingo, 24 de julho de 2022

O TODO EM TUDO


“Enquanto Tudo está no Todo, é também verdade que o Todo está em Tudo. Aquele que compreende realmente esta verdade alcançou o grande conhecimento.” (O Caibalion - Os Três Iniciados)


Quantas vezes a maioria das pessoas ouviu repetir a declaração que a sua Divindade (chamada por muitos nomes) era “Todo em Tudo”, e quão pouco suspeitaram elas da verdade oculta, encoberta por estas palavras tão descuidadamente pronunciadas? A expressão comumente usada é uma sobrevivência da antiga máxima hermética acima citada. Como diz o Caibalion: “Aquele que compreende realmente esta verdade alcançou o grande conhecimento.” E, sendo assim, permiti-nos examinar esta verdade, cujo conhecimento tanto significa.

Nesta exposição da verdade – esta máxima hermética – está encoberta uma das maiores verdades filosóficas, científicas e religiosas.

Nós vos explicamos o preceito hermético a respeito da natureza mental do universo: a verdade que “o universo é mental; ele está dentro da Mente do Todo”. Diz o Caibalion na passagem citada acima: “Tudo está no Todo.” Mas note-se também a declaração correlativa, que: “É também verdade que o Todo está em Tudo”,  reconciliável pela Lei do Paradoxo. É, aliás, uma exata declaração hermética das relações que existem entre o Todo e o seu universo mental...

Os ensinos herméticos são, com efeito, que o Todo está inerente no seu universo, e em cada partícula, unidade ou combinação. Esta expressão é geralmente ilustrada pelos instrutores com uma referência ao Princípio de Correspondência. O instrutor ensina o discípulo a formar uma imagem mental de uma coisa, uma pessoa ou uma ideia, porque todas as coisas têm uma forma mental... Em outras palavras, toda a virtude, vida, espírito e realidade da imagem mental é derivada da mente imanente do pensador. Considerai isto por um momento e logo compreendereis a ideia...



Fonte: Publicações Maitreya, Porto,Portugal
https://publicacoesmaitreya.pt
Fonte da Gravura: Acervo de autoria pessoal

CORAGEM NA AÇÃO


Em uma panorâmica da sociedade contemporânea anotamos o desar (injúria), a agressividade, o crime e o desrespeito pela criatura humana.

As nações desagregadas expõem as feridas profundas da sua decadência.

Os governos desajustados apresentam-se estúrdios (insensatos), vitimados pela prosápia (soberba), tombando na corrupção, na indignidade.

Os grupos sociais agridem-se, famigerados, como se fossem inimigos motivados à destruição recíproca.

... E os indivíduos, que ouviram a proposta do amarem-se uns aos outros, armam-se uns contra os outros em assinalada loucura e perversão.

Tem-se a impressão de que o mal administra a cultura hodierna; que a barbárie governa os sentimentos.

Sente-se uma vaga de agonia, que faz estertorar (afligir) a criatura humana fragilizada e as Instituições vencidas pelo vírus da perversidade.

Em uma observação imediata, parece existir uma conspiração contundente para o infortúnio que assinala os aparentemente bons a benefício dos aparentemente maus.

Anota-se o progresso dos desonestos; o acúmulo de valores dos arbitrários e dos injustos, e a dor que asselvaja, estiolando (debilitando) os que se dedicam ao dever.

O desânimo grassa (alastra-se), enquanto o pessimismo ensombra (ofusca) a cultura moderna.

Todavia, tudo isso é somente aparência, porque a grande realidade é que luz (ilumina) a misericórdia de Deus soberana. E é para este momento de trevas que ela acende um sol de primeira grandeza no empíreo (paraíso/olimpo) tomado pela sombra densa.

Onde a vitória das mentes pervertidas e o triunfo dos desonestos, dos injustos, dos perversos e dos corrompidos? Estarão os cristãos invertendo a ordem dos valores, assinalando somente triunfos? As moedas que se enferrujam, que perdem o valor por decretos e os tesouros que passam de mãos, são vitórias? Onde a glória dos que dominam as consciências com o anestésico da mentira, com a volúpia do suborno e com os recursos da indignidade?

Filhos, mais do que nunca, deve viger em nós a presença do Cristo e dos seus valores. Lamentar, porque somos convidados à luta para mudar essas estruturas carcomidas? Nunca! Jesus não esteve em época melhor do que esta, nem a sociedade de então se caracterizava por virtudes e valores que não sejam semelhantes aos de hoje.

Não nos enfraqueça a dor, nem se nos arrefeça o entusiasmo, porque os anestesiados gargalham enlouquecidos na esquizofrenia delirante da mentira e da ilusão.

Jesus nos prometeu e deu-nos outra forma de triunfo, que foi sobre a cruz.

Em que página do seu Evangelho está consignado que os seus discípulos ganhariam o mundo, o aplauso, a glória ilusória e ridícula, o triunfo da selvageria e o êxito da posição social?

É necessário despertarmos para a profundidade do pensamento do Mestre, que renunciou a todas essas glórias de mentira, aceitando a esperança no reino dos céus, a certeza inalienável da vida imortal.

A dor, meus filhos, é honra que nós devemos desfrutar.

A carne é veiculo transitório, e, como todo veículo, passa breve, sem sentido, sua única finalidade é preparar- nos para a ressurreição triunfal.

Aqueles que o amam, não elegem os triunfos do mundo, que se fazem acompanhar das acerbas (penosas) lágrimas do arrependimento, da amargura.

Colheis, hoje, a sementeira. Prossegui semeando para o amanhã, sem desalento, e, se por acaso, o desânimo se vos acercar, acendei a candeia da alegria na paisagem do coração.

Não vos enganeis nem enganeis a ninguém, acenando em vossa fé com as glórias enganosas da Terra e as alegrias que entorpecem a mente e deixam vazio o sentimento.

Confiai em Deus!

As vossas, são as alegrias dúlcidas do coração afervorado à verdade, que se derivam da consciência tranquila.

A desencarnação alcança a todos: justos e criminosos, nobres e escravos, sábios e estúpidos. Mas a vida, pujante e verdadeira, soa em igualdade de condições para todos, acenando-lhes as recompensas e justiças de acordo com o trânsito carnal.

Não temais! Enxugai o suor e alegrai-vos sem pessimismo, porque vosso é o triunfo sobre a cruz e a ressurreição sobre a morte.



Divaldo Pereira Franco / Bezerra de Menezes



Fonte: do livro "Antologia Espiritual"
Fonte da Gravura: Acervo de autoria pessoal

sábado, 23 de julho de 2022

JUSTIÇA HUMANA E JUSTIÇA DIVINA


Algumas pessoas, que conseguiram escapar à justiça humana, imaginam que também escaparão à justiça divina; não estudaram suficientemente a questão, para se darem conta de que estas duas justiças não são da mesma natureza. A justiça divina pode não lhes tocar exteriormente, mas afeta-os a nível interior. Há criminosos que, supostamente, conseguiram escapar à justiça, mas interiormente estão a definhar: a sua saúde, o seu estado psíquico, tudo se degrada. Exteriormente, alguns elementos ainda se mantêm, mas, pouco a pouco, esses elementos ir-se-ão desmoronando, porque é o lado interior que alimenta, que sustém o edifício. Se o interior se desmoronar, um dia o exterior também se desmoronará. É assim que se manifesta a justiça divina, e as suas sanções são instantâneas: no preciso momento em que o homem comete uma transgressão, alguma coisa nele se obscurece, se desagrega. Mesmo que esta degradação demore anos a manifestar-se exteriormente, no interior já está a acontecer.


Omraam Mikhaël Aïvanhov



Fonte: www.prosveta.com
Fonte da Gravura: Acervo de autoria pessoal

VENDO ATRAVÉS DE NÓS MESMOS


Ouça estas palavras de São Pedro: Ele mesmo levou em seu corpo os nossos pecados sobre o madeiro, para que, mortos para os pecados, pudéssemos viver para a justiça; e por cujas feridas foste curado. (1 Pedro 2:24)

A meditação é o grande caminho da purificação. Toda vez que recitamos nosso mantra, nos purificamos, limpamos nosso espírito. O processo de meditação durante toda a vida é a restauração do espírito em seu estado transluminoso natural. Nosso espírito é como um vidro e o que vemos é nosso próprio reflexo. Mas o vidro deve ser lavado e limpo. É como se o outro lado do vidro estivesse coberto com a soma das escórias e trivialidades de uma vida, com todas as imagens que acumulamos.

A meditação é a limpeza do vidro para que, ao olharmos para ele, possamos ver através dele. Vemos a realidade clara, desimpedida por reflexos de nós mesmos. Temos que meditar diariamente, todas as manhãs e todas as noites porque estamos sempre acumulando mais escórias e mais imagens. A maravilha da vida de Jesus e sua mensagem para nós é que nosso espírito precisa ser liberto das limitações. Cada um de nós é chamado ao desenvolvimento ilimitado, à expansão, à liberdade total à medida que nos elevamos em total união com Deus.

A meditação diária é tão importante porque devemos ter certeza de que nosso espírito está sempre limpo, sempre polido. Em última análise – este é o mistério interior de viver nossas vidas e ter nosso ser – que o próprio cristal nos coloca em contato direto com a realidade.

Eu me pergunto por que há tantas pessoas que têm medo de seguir esse caminho. Acho que a razão é porque vivemos na era do medo. O fenômeno extraordinário de nosso tempo é o medo indescritível que atormenta as pessoas. Há tantas pessoas perdidas em suas vidas, sem a ajuda de sinais, sem padrões. Eles vivem em um mundo onde sentem que tudo é aceito, as velhas regras parecem ultrapassadas e os velhos sistemas de pensamento ou teologia são irrelevantes. O resultado é que ficamos com um medo atormentador desenraizado, flutuando onde estamos, sem saber para onde estamos indo.

A meditação é um retorno para nos ancorarmos na realidade essencial. O retorno ao nosso espírito. O retorno à base onde podemos estar em contato direto com a estrutura básica da realidade. Meditação sobre um retorno a Deus. Embora, é claro, não seja um retorno; é um avanço. É a peregrinação à purificação que resulta em não mais sermos presos ou limitados por imagens espelhadas. É de suma importância porque é o caminho que transcende o medo. Ao entrar em contato com nosso próprio espírito e transcender a nós mesmos no mistério de Deus, o medo é deixado para trás.



Fr. John Main, OSB





Fonte: do livro "O Coração da Criação", Canterbury Press, 2007
Traduzido para o espanhol por Lucía Gayón, e para o português por este blog.
PERMANECER EN SU AMOR - Coordenadora: Lucía Gayón - Ixtapa, México
www.permanecerensuamor.com - permanecerensuamor@gmail.com
Fonte da Gravura: Acervo de autoria pessoal

sexta-feira, 22 de julho de 2022

À FRENTE DO DESESPERO


Dias há nos quais tens a impressão de que mesmo a luz do sol parece débil, sem que consiga fulgir nos panoramas do teu caminho. Tudo são inquietações e ansiedades que pareciam vencidas e que retornam como fantasmas ameaçadores, gerando clima de sofrimento interior.

Nessas ocasiões, tudo corre mal. Acontecem insucessos imprevistos e contrariedades surgem de coisas sem importância que se amontoam, transformando-se em óbice cruel de difícil transposição.

Surgem aflições em família que navegava em águas de paz; repontam problemas de conjuntura grave em amigos que te buscam socorros imediatos; e, como se não bastassem, a enfermidade chega e se assenhoreia da frágil esperança que, então, se faz fugidia.

Nessa roda-viva, gritas interiormente por paz e sentes indescritível necessidade de repouso. A morte se te afigura uma bênção capaz de liberar-te de tantas dores!...

Refaze, porém, a observação.

Tudo são testemunhos necessários à fortaleza espiritual, indispensável à fixação dos valores transcendentes. Não fora isso, porém, todas essas abençoadas oportunidades de resgate, e a vida calma enfraqueceria o teu caráter, conspirando contra a paz porvindoura, por adiar o instante em que ela se instalaria no teu íntimo.

Quando tudo corre bem em volta de nós e de referência a nós, não nos dói a dor alheia nem nos aflige a aflição do próximo. Perdemos a percepção para as coisas sutis da vida espiritual, a mais importante, e desse modo nos desviamos da rota redentora.

Não te aborreças, pois, com os acontecimentos afligentes que independem de ti.

A família segue adiante, o amor muda de domicílio, a doença desaparece, a contrariedade se dilui, a agressão desiste, a inquietude se acalma se souberes permanecer sereno ante toda dor que te chegue, enquanto no círculo de fé sublimas aspirações e retificas conceitos.

Continua fiel no posto, operário anônimo do bem de todos, e espera.

Os ingratos que se acreditaram capazes de te esquecer lembrar-se-ão e possivelmente volverão; os amigos que te deixaram, os amores que te não corresponderam, aqueles que te não quiseram compreender, os que zombaram da tua fraqueza e ridicularizaram tua dor envolta nos tecidos da humildade, e os que investiram contra os teu anelos, todos voltarão, tornarão sim, pois ninguém atinge a plenitude da montanha sem a vitória pelo vale que necessita ser vencido.

Tem calma! Silencia a revolta!

Refugia-te na palavra clarificadora do Evangelho consolador e enxuga tuas lágrimas com as suas lições. Dos seus textos extrai o licor da vitalidade e tece com as mãos da esperança a grinalda de paz para o coração lanhado e sofrido. Se conseguires afogar todas as penas na oração de refazimento, sairás do colóquio da prece restaurado, e descobrirás que, apesar de tudo acontecer em tais dias, Jesus luze intimamente nas províncias do teu espírito. Poderás, então, confiar e seguir firme, certo da perene vitória do amor.



Divaldo Pereira Franco / Joanna de Ângelis




Fonte: do livro "Lampadário Espírita"
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quinta-feira, 21 de julho de 2022

VELHOS HÁBITOS E CONCEPÇÕES ERRÔNEAS


O cristianismo põe a tônica na crucificação de Jesus. Evidentemente, é bom associar-se à paixão e à morte de Jesus para se compreender a grandeza do seu sacrifício. Mas, na nova vida que o Cristo agora nos propõe, não é preconizado que se fixe pelo suplício da cruz, pois o Cristo também se manifesta pela beleza, pela alegria, pela luz. Na nova cultura, a ideia da glória do Cristo é que alimentará a nossa vida interior. Deus rejubilará ao ver que já não damos a primazia ao lado negativo, que deixamos de abraçar o pó e de nos ajoelhar diante de túmulos, pois Ele destinou-nos um futuro muito mais grandioso. Os mortos de que devemos ocupar-nos não são os dos cemitérios, mas sim os que estão sepultados no interior de nós: os nossos velhos hábitos, as nossas concepções velhas e erradas. São esses os mortos que temos de procurar, para acabarmos com eles!



Omraam Mikhaël Aïvanhov



Fonte: www.prosveta.com
Fonte da Gravura: Acervo de autoria pessoal

quarta-feira, 20 de julho de 2022

SILÊNCIO, SIMPLICIDADE E ABISMO INTERIOR


No processo de simplificação evangélica é necessário aludir à estreita relação que tem com o silêncio. No fundo, essa renúncia aos apegos, afetos, necessidades, preocupações consiste no exercício de silenciar todas as pressões externas que me dizem o que é importante para os outros, e também as pressões internas que me impõem o que absolutamente preciso para viver: os afetos , estima, valor, segurança ou prestígio. De fato, o silêncio é o clima em que o olhar se simplifica e o coração se unifica. Mas, para isso, não basta o silêncio externo, em que se silenciam as vozes e os ruídos ao nosso redor, é necessário sobretudo o silêncio interior, que consiste em silenciar as reivindicações e os ruídos que vêm das paixões.

Se meus desejos, meus medos, minhas alegrias e minhas dores, se todos os movimentos que vêm dessas "quatro paixões" não fossem perfeitamente ordenados a Deus, eu não estaria solitário, haveria ruído em mim; é necessário o apaziguamento, o "sono das paixões", a unidade do ser. [1]

É a mesma coisa que São João da Cruz nos ensina quando fala de acalmar a casa interior: "Daí, nas quatro paixões da alma, que são: alegria, dor, esperança e medo, sendo acalmado pela mortificação contínua, e nos apetites naturais adormecer na sensualidade pela secura ordinária, e na elevação da harmonia dos sentidos e poderes interiores, cessando suas operações discursivas, como dissemos, que é todo o povo e morada da parte inferior da alma, que é o que chama aqui de sua casa, dizendo: Minha casa já está calma. [2]

O silêncio de que precisamos não pode consistir simplesmente em calar a boca ou fugir dos ruídos externos. O verdadeiro silêncio tem a ver com a descoberta do tesouro, porque é fruto da atração de Deus. Se ele me encontra, me oferece seu amor e me chama para ele - essa é a essência da vocação cristã - ele me atrai para ser dele. E a primeira resposta a essa atração é atenção prioritária a ele, escutá-lo; e só podemos ouvir se calarmos, silenciarmos. Mas presos nas complicações da vida e dentro de nós mesmos, não podemos ouvir a Deus. Devemos, então, entrar num processo pelo qual tudo se simplifica, precisamente porque as vozes interiores e exteriores que não vêm de Deus são silenciadas e o supérfluo desaparece, para que Deus possa começar a ser verdadeiramente Deus em nós. É um itinerário ao qual Deus nos atrai para nos fazer seus e entrar em profunda comunhão de amor com Ele; itinerário que se percorre na desapropriação e no abandono, que supõe uma verdadeira descida ao abismo interior em que tudo o que não é Deus é silenciado e, assim, tudo se simplifica à força de olhar apenas para Deus e buscar apenas a sua vontade. Esta mudança é como a inclinação que nos faz descer para o abismo interior onde Deus habita. É o caminho necessário para que nossa habitação em Cristo se torne uma realidade da mesma forma que ele habita em nós. E a simples intenção é o que nos torna semelhantes a Deus.

A simplicidade da intenção é o que dá às almas o descanso em Deus, como um abismo insondável ao qual devemos aspirar, como nos diz a carta aos Hebreus: "Esforcemo-nos, pois, por entrar nesse descanso". (Hb 4,11)

"A simplicidade comunica à alma o repouso do abismo." Ou seja, o descanso em Deus, abismo insondável, prelúdio e eco daquele descanso eterno de que fala São Paulo: "Nós, os que cremos, seremos introduzidos no descanso". (Hb 4,3) [3]


Notas:
[1] Santa Isabel de la Trinidad, Últimos ejercicios, día décimo.
[2] San Juan de la Cruz, Noche Oscura, Libro I, cap. 13, 15.
[3] Santa Isabel de la Trinidad, Últimos ejercicios, día tercero, que comenta una frase de Ruisbroeck.





Fonte: Hermandad de Contemplativos en el Mundo
https://contemplativos.com/retiro-espiritual/la-simplicidad-espiritual/
Fonte da Gravura: https://pixabay.com/pt/illustrations/mar-p%c3%b4r-do-sol-arvores-papagaios-4420591/

NOSSA VIDA MENTAL


Nossa vida mental é o campo de nossa consciência desperta na faixa evolutiva em que o conhecimento adquirido nos permite operar.

Encarnados e desencarnados povoam o planeta Terra na condição de habitantes de um imenso edifício de vários andares, em posições horizontais diversas, de acordo com o estado consciencial de cada um, produzindo pensamentos múltiplos que poderão atrair, repelir ou neutralizar.

A mente transmite de dentro para fora as impressões da alma e recebe de fora para dentro as sensações da matéria, motivo pelo qual a alma reflete sua vontade, seu desejo, sua inteligência, sua memória e sua imaginação.

O pensamento desloca, em torno de nós, forças sutis ou campo vibratório, construindo paisagens ou formas e criando centros magnéticos ou ondas, com os quais emitimos a nossa atuação ou recebemos a atuação dos outros.

Os pensamentos são ondas de força que poderão alimentar, deprimir, sublimar, arruinar, integrar, induzir e desintegrar, razão por que, quem mais pensa, dando corpo ao que idealiza, mais apto se faz à recepção das correntes mentais invisíveis, nas obras do bem ou do mal.

É por esta razão que, quando vivemos e convivemos com criaturas idealistas, operosas, confiantes, otimistas e realizadoras, somos beneficiados, nutridos ou abastecidos de substância mental em grande proporção, favorecendo o nosso trabalho em forma de impulsos e estímulos que a nossa mente recolhe; ao passo que, quando vivemos e convivemos com criaturas desanimadas, pessimistas e amarguradas, nosso nível mental ou tônus mental fica sujeito a depressões e enfermidades.

Todos somos afetados pelas vibrações de paisagens, de pessoas e de coisas que nos cercam, e é por isso que, quando não nos habilitamos a conhecimentos mais altos e não exercitamos a vontade para sobrepor-nos às circunstâncias de ordem inferior, sofremos a imposição do meio onde vivemos e convivemos.

Princípios idênticos regem as nossas relações, uns com os outros; conversações alimentam conversações, pensamentos ampliam pensamentos, e é em função deste princípio que demoramos muito mais conversando com aqueles que se afinam com o nosso modo de ser e de proceder.

Quando estamos pensando, imaginando, desejando ou agindo, seja no mundo físico ou no mundo espiritual, nossa mente está sintonizada com todos aqueles que pensam, imaginam, desejam ou agem como nós, da mesma forma que a fonte está comandada pela nascente.

Daí a grande necessidade de constante renovação para o bem, orando e vigiando, trabalhando e servindo, aprendendo e amando, para que a nossa vida mental ou vida íntima se ilumine e aperfeiçoe, se realmente desejamos a companhia dos bons, dos sábios e dos justos, através do intercâmbio mental.



Ruy Gibim




Fonte: Revista "Reformador" - Junho 2007
Federação Espírita Brasileira - https://www.febnet.org.br/
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domingo, 17 de julho de 2022

SIMPLICIDADE E VERDADE


(...) A chave para a unidade interior que leva à simplicidade é (...) focar plena e conscientemente em Deus. Na medida em que permitimos que as realidades da vida - por mais importantes que sejam - nos afastem dos fundamentos, mesmo que momentaneamente, caímos na dispersão que leva a um coração dividido. E o resultado dessa falta de coerência entre a centralidade de Deus, em que cremos, e as realidades que nos absorvem é o cansaço e a falta de frutos em nossas vidas.

Por outro lado, um olho são, limpo e simples dá-nos um coração unificado, que tem um único amor, do qual brota tudo o que procura e deseja, que é uma coisa: Deus. Para chegar lá, é preciso percorrer o caminho da unificação de tudo em Deus: um itinerário espiritual que envolve um sério trabalho ascético de vitória para reconhecer Deus em tudo, distingui-lo de qualquer realidade que não seja ele e centrar o olhar e o coração, com amor exclusivo, nele. O sinal de que você está avançando nesse caminho é a paz sobrenatural e o fruto que ela produz em si mesmo e nos outros.

Tudo isso não pode ser reduzido a um exercício circunstancial realizado em algum momento singular, mas deve conformar-se ao habitual "tom" de nossa vida ordinária, que serve como exercício permanente para realizar o indispensável discernimento de escolher Deus como "único necessário" a cada momento e viver o momento presente com toda intensidade sobrenatural.

"Marta, Marta, você está inquieta e preocupada com muitas coisas; apenas uma é necessária. Maria, então, escolheu a melhor parte, e não lhe será tirada." (Lc 10,41-42)

Este não é um aspecto tangencial da espiritualidade cristã, mas um elemento importante dela. Isso fica claro, por exemplo, por São Tomás de Aquino explicando a profunda relação que existe entre simplicidade e verdade, a ponto de se identificar.

A simplicidade, como o próprio nome sugere, é o oposto da duplicidade, que consiste em pensar uma coisa e dizer outra. Portanto, a simplicidade pertence à virtude da veracidade. E retifica a intenção não diretamente, pois esta é típica de toda virtude, mas exclui a duplicidade por desacordo entre o que se pretende e o que se manifesta. [1]

A virtude da simplicidade e a da verdade são, na realidade, a mesma e diferem apenas com uma distinção de razão, pois em um caso se chama verdade por causa da concordância dos sinais com o significado, e em outro simplicidade, porque não se propõe objetivos diversos, a saber: fingir internamente uma coisa e externamente expressar outra diferente. [2]

Se formos capazes de aplicar a verdade aos eventos que nos acontecem e à nossa própria vida interior, tudo será simplificado imediatamente (...).

Agora, para alcançar a simplicidade, é preciso ir além da mera veracidade, que evita enganos e mentiras. São Tomás fala da "verdade da vida", diferente da verdade que consiste em declarar as coisas como são. A vida é verdadeira quando se adapta ao seu ser autêntico, ao que Deus tem em mente para o ser humano e para cada pessoa. Podemos dizer que temos uma vida "verdadeira" na medida em que ela está de acordo com o plano de Deus. E esta verdade da vida equivale à simplicidade do coração. O homem simples (simples, reto e íntegro) é primeiro o que deve ser, e depois manifesta, sem engano, o que é.

Comentando o texto de 2Co 1,12, São Tomás identifica a retidão de consciência com a simplicidade do coração: "O motivo de nosso orgulho é o testemunho de nossa consciência: ela nos assegura que procedamos com todo o mundo, e sobretudo convosco, com a sinceridade [simplicidade] [3] e honestidade de Deus, e não pela sabedoria carnal, mas pela graça de Deus”. Vemos que a simplicidade consiste, ao mesmo tempo, em manter a intenção dirigida a Deus com justiça e em fazer, de fato, o que é bom em si, a sinceridade da ação. Tudo isso se opõe à sabedoria da carne, que é o oposto da simplicidade. [4]

Recordemos, neste sentido, que São Paulo recomenda simplicidade de coração aos servos a serviço de seus senhores; uma simplicidade que se alcança olhando para Cristo e cumprindo a vontade de Deus, e se manifesta em obras: "Escravos, obedeçam a seus senhores na Terra com respeito e temor, com a simplicidade de seu coração, como Cristo. Não pelas aparências, para parecer bem diante dos homens, mas como servos de Cristo que fazem, de coração, o que Deus quer, voluntariamente, como quem serve ao Senhor e não aos homens." (Ef 6:5-7)

Assim, no caso dos escravos, a simplicidade de coração consiste em agirem não em face de seus senhores, para agradá-los com aparências, mas como servos de Cristo, o que demonstram fazendo a vontade de Deus. É por isso que ele pode dizer a todos nós: "Tudo o que fizerdes, fazei-o de toda a vossa alma, como para servir ao Senhor e não aos homens." (Cl 3,23) Assim, segundo Santo Tomás, a simplicidade une a verdade do coração e a verdade das obras, de modo que a simplicidade leva a obedecer com retidão a vontade de Deus. [5]

Comentando a carta aos Filipenses, São Tomás dá-nos a razão última da simplicidade do cristão, que é que somos filhos de Deus e devemos assemelhar-nos a Ele em tudo, também na sua simplicidade: «Faça o que fizer, seja sem protestos nem argumentos Assim sereis irrepreensíveis e humildes, filhos de Deus sem mácula.” (Fp 2,14-15) Isso só se consegue ser alcançado dirigindo permanentemente o nosso olhar para Deus e mantendo a intenção unificada no Uno. [6]

Consequentemente, para ser simples, é preciso agir com retidão de intenção, de modo que o que realmente queremos e buscamos seja cumprir a vontade de Deus, direcionando conscientemente toda a nossa vida para Deus e evitando que outros interesses se infiltrem. Por isso é muito importante que nos esforcemos para "purificar a intenção". (...)

(Texto completo no sítio infra especificado)


Notas:

[1] Santo Tomás de Aquino, Suma Teológica, II-II, q. 109, a. 2.

[2] Santo Tomás de Aquino, Suma Teológica, II-II, q. 111, a. 3.

[3] El texto griego dice ἁπλότητι, como Mt 6,22, y la Vulgata en latín traduce simplicitate.

[4] Cf. Santo Tomás de Aquino, In II ad Corinthios, cap. 1, lect. 4, n. 32, citado por Pablo Martí, La simplicidad moral en el hombre (https://mercaba.org/FICHAS/VyV/lsmeeh.pdf).

[5] Santo Tomás de Aquino, In ad Ephesios, cap. 6, lect. 2, 344-348. En In ad Colossenses, cap. 3, lect. 4, n. 178, se refiere a un texto similar: «Esclavos, obedeced en todo a vuestros amos humanos, no por servilismo o respetos humanos, sino con sencillez (ἁπλότητι / simplicitate) y temor del Señor» (Col 3,22), en el que relaciona la simplicidad con el temor de Dios.

[6] Santo Tomás de Aquino, In ad Philipenses, cap. 2, lect. 4, n. 81.



Fonte: Hermandad de Contemplativos en el Mundo
https://contemplativos.com/retiro-espiritual/la-simplicidad-espiritual/
Fonte da Gravura: https://pixabay.com/pt/photos/dente-de-le%c3%a3o-flor-espiritual-seixo-864963/

sábado, 16 de julho de 2022

RECORDAÇÕES DE NOSSA VIDA


Como a maioria das pessoas, vós tendes o mau hábito de recordar sobretudo o que vos fez sofrer; guardais tudo convosco, recordando, ruminando.

Isso é muito perigoso, não se deve remoer o que foi mau.

Há que tirar daí uma conclusão, de uma vez por todas, e não pensar mais no assunto.

Fazeis mal a vós próprios revivendo continuamente estados ou acontecimentos negativos.

Tentai, antes, recordar os momentos mais luminosos da vossa existência, procurai compreender por intermédio de quem e como eles aconteceram, rememorai-os muitas vezes, exatamente como voltais a ouvir muitas vezes uma música de que gostais, e assim revivereis as mesmas sensações de pureza, de liberdade, de luz.



Omraam Mikhaël Aïvanhov




Fonte: www.prosveta.com
Fonte da Gravura: Acervo de autoria pessoal

SANTO ANTÔNIO E A TEOSOFIA DO SOL


A visão parcial da foto (acima) de Roberto Gil mostra a antiga escultura de Santo Antônio, patrono da cidade de Lisboa, que está na Igreja de Santo Antônio. A escultura foi poupada pelo terremoto de 1755. A imagem contém um Sol acima da cabeça do Santo.



O Santo de Lisboa e Pádua Ensina Ideias e Princípios Básicos da Filosofia Esotérica



A alma e o espírito nunca se separam da natureza. Apenas o ser humano desinformado faz isso, e assim provoca sofrimento.

A sabedoria antiga anda perto da natureza e vê o sagrado nos fenômenos do meio ambiente. A filosofia esotérica sabe que a natureza tem sete níveis de existência e consciência.

Antes de ela ser física, ela é espiritual; durante sua existência física ela é espiritual, e depois de ser física, ela volta a ser apenas espiritual por algum tempo. A filosofia esotérica autêntica é uma filosofia da natureza, ao mesmo tempo que é uma filosofia do espírito.

Este fato fica claro também no cristianismo do frei Antônio de Lisboa e Pádua. Em sermão do início do século XIII, Santo Antônio cita a Epístola de Tiago, 1,17:

“Toda dádiva excelente e todo dom perfeito vem do alto, desce do Pai das luzes, como o raio desce do Sol.”

Em seguida Antônio identifica a luz do Sol com Jesus:

“Assim como o raio do Sol, descendo do Sol, ilumina o mundo e, todavia, não se afasta nunca do Sol, também o Filho de Deus, descendo do Pai, iluminou o mundo e, contudo, não se afastou nunca do Pai, porque faz um todo com o Pai; ele mesmo o disse em S. João: eu e o Pai somos um só.” [1]

A teosofia ou sabedoria divina não foi criada por Helena Blavatsky mas existe desde antes do surgimento da humanidade atual. Olhando para estas passagens desde o ponto de vista da filosofia esotérica, vemos uma alusão aos sete níveis de consciência do ser humano. O Sol ou Pai do Céu corresponde a Atma, o sétimo princípio, uma fagulha do Absoluto. O Sol envia ao mundo o seu Filho, isto é, um raio de luz, Jesus, o sexto princípio, chamado em sânscrito de Buddhi, o princípio da compaixão universal.

O “mundo” que é iluminado por Jesus ou Buddhi, a Luz divina, significa os cinco princípios inferiores da consciência. O quinto é a mente pensante, “Manas”. O quarto princípio é a emoção, “Kama” em sânscrito. O terceiro, “Linga Sharira”, garante as estruturas sutis astrais do corpo (pelas quais flui a vitalidade). O segundo princípio é “Prana”, a vitalidade. Finalmente o primeiro princípio é o corpo físico propriamente dito, Sthula Sharira.

E é preciso lembrar que a luz da estrela está presente em cada átomo do corpo físico do ser humano. A luz astral, cujo nível espiritual e superior os cristãos chamam de Jesus, permeia todas as coisas.

Temos então em primeiro lugar a estrela, ou Sol; em seguida a luz da estrela, e finalmente o mundo. Ou seja, o Pai do Céu, o Filho, e o mundo, ou humanidade. E cada ser humano possui em si mesmo o Pai, Atma, o Filho, Buddhi, e os outros cinco níveis de consciência.

Mas Jesus e o Pai são um só. Atma e Buddhi são inseparáveis. Não há Sol sem Luz, nem Sabedoria sem Compaixão, nem Pai sem Filho. E esta unidade fundamental é a Mônada.

Antônio destaca algumas linhas mais adiante que todos somos filhos da Luz e nascemos através da Verdade.

A luz permite ver a Verdade.

O Sol é o Logos, ou seja, o conjunto harmônico das leis que comandam o universo. O Sol é a Verdade e o conhecimento absolutos. Através da Verdade alcançamos a iluminação. É por isso que nas imagens e esculturas de muitos santos e sábios – inclusive de Santo Antônio – é comum ver um pequeno Sol junto às suas cabeças.


Nota:

[1] Da p. 417 do volume I de “Obras Completas”, Santo António de Lisboa, Lello & Irmão, Editores, Porto, Portugal, 1987, edição bilíngue (latim e português) em dois volumes. Sobre sermos todos filhos da luz, veja a p. 418.





Carlos Cardoso Aveline




Fonte: FILOSOFIA ESOTÉRICA.COM
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Fonte da Gravura: https://www.patriarcado-lisboa.pt/site/index.php?id=10105

DEIXANDO DE LADO A SOBERBA


Existe uma Cura para a Doença de Querer Superioridade Sobre Outros


A soberba é uma ilusão que destrói o discernimento


A vida faz com que o soberbo seja humilhado, para que descubra a humildade e o bom senso. Infelizmente, pode ocorrer que o indivíduo fique longo tempo preso na oscilação violenta entre os extremos da glória pessoal e da completa derrota, ambas imaginárias.

A soberba é geralmente definida como sinônimo de orgulho, arrogância e um sentimento de superioridade em relação aos outros. Dela decorre a vontade de obter privilégios, de inferiorizar, prejudicar e desprezar os nossos semelhantes. Isso com frequência é feito de modo sorrateiro e disfarçado. Muitos sofrem de soberba e nem sabem disso. O fenômeno é com frequência subconsciente.

A soberba pode começar como uma defesa contra a humilhação. O pobre eu maltratado quer indenizar a si mesmo pelo que sofreu, e trata de fazer isso através da fantasia da autoimportância pessoal. Cai então numa gangorra de altos e baixos, de glória e derrota, e tudo nesta oscilação é igualmente falso e exagerado.

Em um inspirador sermão intitulado “O Espírito da Soberba”, Santo Antônio de Lisboa e Pádua afirma que o soberbo pisa sobre os pobres e os menores, mas também gosta de desprezar os que lhe são iguais, e insulta e zomba dos maiores. Antônio cita uma epístola de Pedro, em que se afirma que Deus – isto é, a lei universal – resiste aos soberbos, e dá a sua graça (a graça do bom carma) aos humildes. [1]

O destino do soberbo é ser humilhado, para descobrir a humildade: mas muitos soberbos, querendo compensar o trauma da humilhação sofrida ou evitar a profunda humilhação que temem, desenvolvem como mecanismo de proteção uma camada ainda mais forte de orgulho disfarçado e vão novamente à luta contra o mundo, sem aceitar a lição do realismo e do equilíbrio.

A soberba é um problema geral da humanidade, afirma Antônio. Nenhum de nós está completamente livre do autoengano que é o orgulho. Na família, assim como na sociedade e no convívio entre as nações, as lutas por poder são quase sempre duelos mais ou menos disfarçados entre formas diferentes de soberba.

As guerras, a prática do ódio na política e certos campeonatos de futebol são exemplos claros disso.

Mas a doença da busca de superioridade sobre os outros vai muito além da competição e da inveja nas relações humanas. A soberba é o princípio de toda ilusão. A luxúria e outras formas de prazer exagerado são variantes desta fantasia adoentada de superioridade.

Por isso o Cristianismo, assim como as religiões orientais, descreve o sábio como alguém exteriormente pobre, manso e humilde de coração. Os meios esotéricos e teosóficos não estão de modo algum livres da soberba. O desejo de parecer santo é uma marca do tolo infantil, que prefere fingir para si mesmo e para os outros, ao invés de viver com autenticidade.

Um dos princípios básicos da filosofia ocidental clássica é o axioma estoico do imperador Marco Aurélio, segundo o qual é aconselhável viver cada dia da nossa vida como se fosse o último. Lembrar da fragilidade da existência humana é uma lição de realismo e permite perceber quão preciosa ela é, e como são fúteis e inúteis as manias de grandeza, assim como as manias de perseguição.

O Jesus do Novo Testamento deu um exemplo de vida simples e humilde. Francisco de Assis, para compensar a soberba que via no alto clero cristão da sua época, criou a “ordem dos frades menores”, da qual Santo Antônio de Lisboa foi membro.

E Antônio prevê:

“…Quando uma humildade mais forte entrar no coração do homem e vencer o espírito da soberba e expulsar a cegueira do entendimento, então [os cinco sentidos] se mudarão dos vícios para as virtudes, da soberba para a humildade. Então, pois, aparecerão nos olhos a humildade e a simplicidade; na boca ressoarão a verdade e a bondade; dos ouvidos se removerá toda maledicência e toda lisonja; nas mãos se encontrará a pureza e a piedade; nos pés, a ponderação.” [2]

Antônio termina o sermão pedindo a Jesus – símbolo da alma espiritual de cada um – que vença com humildade a soberba do sentimento maldoso. E que nos possibilite quebrar com a simplicidade do coração a dureza da soberba e do orgulho, e “estender por toda parte nos sentidos do nosso corpo o sinal da humildade, a fim de que mereçamos chegar à sua glória”.

A humildade de que se fala na mística cristã e na teosofia autêntica é a base da verdadeira dignidade interior. Graças a ela, o ser humano é suficientemente realista para perceber que tem em si mesmo algo magnífico, a consciência elevada da sua própria alma espiritual. De outro lado, o eu inferior, que coordena o funcionamento dos seus cinco sentidos, é como um pobre animal a que pode faltar equilíbrio no modo como avalia a si mesmo. O eu inferior deve ser bem cuidado, corretamente treinado, e esclarecido sobre sua função na vida, para que desenvolva o necessário bom senso.


NOTAS:

[1] “Obras Completas”, Santo António de Lisboa, Lello & Irmão, Editores, Porto, Portugal, 1987, edição em dois volumes, ver volume I, pp. 186-187. Santo António, ou Antônio, nasceu entre 1190 e 1195 e viveu até 1231.

[2] “Obras Completas”, vol. I, pp. 191-192. No original deste trecho, temos “detracção”, ao invés de “maledicência”, palavra que uso para facilitar a compreensão do leitor do século 21. Alguns tempos de verbos foram adaptados à gramática atual.




Carlos Cardoso Aveline




Fonte: FILOSOFIA ESOTÉRICA.COM
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sexta-feira, 15 de julho de 2022

A CHAMADA É ENTRAR NA EXPERIÊNCIA AGORA, HOJE


O caminho da meditação é a própria simplicidade. Tudo o que temos a fazer é arranjar tempo todas as manhãs e todas as noites de nossas vidas. Isso significa uma conversão radical da obscura consciência egoísta. Ao não pensar nossos próprios pensamentos, não construir nossos próprios planos, entramos no mais profundo silêncio, na mais profunda reverência do ser; isso é nos enraizar em Deus. Até o nosso corpo está incluído nesse processo. Quando meditamos sozinhos ou com outras pessoas, devemos fazer um esforço sério para sentar e ficar quietos, literalmente quietos, durante todo o tempo de meditação. Este é o sinal físico da conversão interior. Consiste em um certo abandono do corpo. Então, você fecha os olhos e começa a recitar sua palavra, seu mantra. Recite-o pacificamente, calmamente e permita que a palavra penetre nas profundezas do seu ser enquanto cria uma ressonância dentro de você. Cada parte de você em ressonância com Deus. O mantra traz essa realidade. À medida que entramos nessa ressonância, entramos na luz que é o seu Amor.

A maravilha da revelação cristã, que é a mensagem comunicada por Jesus, é que cada um de nós em cada ônibus, em cada prédio de escritórios, em cada sala de aula, em cada casa é chamado não apenas a ver através da luz, mas nossa missão final é poder ver a própria luz. Nesse ponto nos tornamos indivisíveis, um com a luz. Esse é o momento, como descreve São Pedro: “compartilhamos a mesma essência de Deus”. Esse é o nosso destino atual. Devemos começar a viver esse destino agora, preparar-nos para sua plenitude. Maravilha e mistério nos transformam agora. E o propósito de nossa meditação diária é aprender a viver agora, nesta vida, em cada momento de nossa existência, em harmonia com o supremo, com nosso destino eterno. A meditação diária é nossa preparação atual para um destino que convida cada um de nós para a expansão infinita do espírito, a expansão para a pura alegria de ser.

Claro que devemos ter cuidado para não nos embriagarmos com as palavras, falando do nosso destino. Devemos tomar medidas práticas para entrar nele. Há um limite estrito para o benefício obtido ao ler livros ou ouvir palestras sobre meditação. A chamada é para entrar na experiência agora, hoje. Cada um de nós deve aprender a simplicidade, a humildade, a pobreza de espírito, contentando-se em repetir nossa palavra do começo ao fim durante a meditação. Isso significa que abandonamos todos os pensamentos, inclusive os mais recorrentes ou insistentes: isso está me fazendo bem? O que estou ganhando com isso? Toda ação de egocentrismo deve ir para ser lançada ao verdadeiro centro nas profundezas do ser de Deus.

Quando começamos, devemos dar um passo de fé. Mas se repetimos o mantra com espírito de humildade, e o repetirmos todas as manhãs e todas as noites, do começo ao fim, seremos capazes de entender agora, em tempo hábil, o que é a vida eterna. Começaremos a entender o que é a alegria de ser. Começará a compreender a brilhante infinidade do ser de Deus. No infinito de Deus encontramos a felicidade, e com a felicidade encontramos a luz.

É-nos dito: 'Porque Deus, que disse que das trevas resplandecesse a luz, é aquele que resplandeceu em nossos corações, para iluminação do conhecimento da glória de Deus, na face de Jesus Cristo.' (2 Cor. 4,6)



Fr. John Main, OSB




Fonte: do livro "O Coração da Criação", Canterbury Press, 2007
Traduzido para o espanhol por Lucía Gayón, e para o português por este blog.
PERMANECER EN SU AMOR - Coordenadora: Lucía Gayón - Ixtapa, México
www.permanecerensuamor.com - permanecerensuamor@gmail.com
Fonte da Gravura: Acervo de autoria pessoal

DOUTRINA ESPÍRITA OU ESPIRITISMO

 





Fonte: Federação Espírita Brasileira
Brasília-DF
https://www.febnet.org.br/


quinta-feira, 14 de julho de 2022

A LUZ É O VERBO


A luz é a matéria que Deus, o Fogo Primordial, emanou de Si, na origem do mundo, quando disse: «Haja luz!».

Essa luz é o Verbo mencionado no início do Evangelho de São João: «No começo era o Verbo, e o Verbo era com Deus, e o Verbo era Deus. Tudo o que foi feito, foi feito por Ele...».

A luz é o Verbo que o Criador proferiu e pelo qual criou o mundo.

O mundo físico, tal como nós o conhecemos, não passa de uma condensação da luz primordial.

Deus, o princípio ativo, projetou a luz, e foi sobre essa luz, que já era uma matéria, que Ele agiu para criar o Universo."



Omraam Mikhaël Aïvanhov



Fonte: www.prosveta.com
Fonte da Gravura: Acervo de autoria pessoal

O ECO INTERIOR


Meu pai espiritual costumava me dizer: sua vida é oração e a maneira como você a vive é seu método particular. Nesse sentido, pode ser muito bom ter “momentos fortes” de oração como dizem, mas cuidado para não cairmos no esquecimento depois.

Ele sempre insistiu que a vida deveria ser uma liturgia ou uma cerimônia de louvor. Que se de alguma forma separássemos o que era oração ou meditação do resto de nossas ações, poderia haver uma inclinação gradual para a dessacralização de certas atividades ou momentos. Admitiu, sem dificuldade, que todos nós temos etapas e momentos diferentes no caminho espiritual; reconhecia, então, que já não estava mais acostumado a pedir e nem mesmo agradecer especialmente, mas sim a “deixar-se ir”. Esse deixar-se guiar tinha indicadores claros e o principal deles era a percepção da Presença.

Perguntei-lhe muito sobre esse assunto, sobre como era possível que Deus fosse percebido. E ele respondeu que essa percepção era a oração contínua a que se referia. Que poderia tomar muitas formas, como "A Oração de Jesus"*, vivendo no “cântico” do Nome; que muitas outras devoções diversas poderiam ser usadas ou que havia mesmo aqueles que haviam substituído os pensamentos pela repetição de salmos ou passagens da escritura sagrada. Mas que a principal pista que ele poderia me dar e ao mesmo tempo a mais simples era esta: se você está em seus pensamentos você não percebe Deus. No momento em que você ignora seus pensamentos, você se aproxima Dele e quando você fica em silêncio, ou seja, quando você realmente presta atenção, sua Presença aparece.

Eu era apaixonado por isso como uma possibilidade e ao mesmo tempo me revoltava. Como o silêncio poderia ser tudo o que era necessário? O que é o silêncio, perguntei a ele? No início, é parar a marcha, desacelerar tudo e, paradoxalmente, ouvir os sons. Quando você pára você percebe o movimento do mundo, você se torna um ponto fixo. Quanto mais parado, mais tudo se move.

No começo você acalma seu corpo, depois desacelera a respiração, depois ouve os sons próximos e depois de um tempo presta atenção aos que estão longe, muito longe. E aí você já percebe uma mudança importante no fluxo das coisas, que nada mais é do que o rio dos seus pensamentos. Não brigue com os pensamentos, deixe-os passar sem lhes dar importância. Este era um modo que lhe servia bem em meio à agitação. Saia do ritmo geral e preste atenção. Atenção em quê? Ao silêncio que estava no fundo de todo barulho, à quietude que abraça todos os movimentos.

Ele não se referia a uma determinada meditação, mas a uma forma de se “vestir” no meio da cidade ou em meio às tarefas. Mas ele disse que todos nós temos nossa marca única ou a maneira pela qual Deus se dá a conhecer a nós. Há aqueles que se conectam pela observação da beleza de qualquer forma que se apresente, ou seja, naquela harmonia especial que produz a combinação das coisas em um dado momento. Outros foram canalizados pela absoluta dedicação à atividade do momento. Alguns se apaixonaram pelo Santo Nome** e não conseguiam mais parar de ouvi-lo em seus corações ou em uma certa forma de “eco” interior.

Ele costumava me dizer que o único propósito da vida humana era "se deixar levar" por Deus. Que venhamos a ser inflamados pelo seu Espírito e que nessa união ígnea estavam todas as respostas para todas as perguntas e que foi em vão tentar entender. Querer entender Deus e o projeto sagrado com nossa compreensão é como tentar navegar em um navio de pedra. Os dentes são para mastigar, os pulmões para respirar, a mente para implementar questões funcionais. Não é o órgão para se juntar a Ele.

No entanto, deixou claro que a razão não deve se opor à fé, porque senão em momentos difíceis a fé perdeu substância e foi derrotada pelas contradições da razão. Ele também insistiu que a fé não é o que comumente entendemos por ela. Essa fé não é realmente acreditar, mas já, de alguma forma, conhecer e saber com certeza. Apesar de receber todo esse ensinamento, Deus parecia fugidio, completamente ausente, e a beleza que eu via em tudo estava envolta na nostalgia da finitude.

* "Oração de Jesus" ou "oração do Coração": "Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus, tenha misericórdia (piedade) de mim (de nós) pecador(es)."

** "Santo Nome": Senhor Jesus Cristo.




El Santo Nombre (Autor não citado)



Fonte: Blog El Santo Nome
https://elsantonombre.org
Fonte da Gravura: Acerco de autoria pessoal