terça-feira, 14 de julho de 2020

INTELECTIVO - INTUITIVO


Se alguém me pergunta, o que é Deus? disse Santo Agostinho, confesso que não sei; mas, se ninguém me pergunta, eu sei.

Com esta frase enuncia o grande gênio africano um fato que todo homem espiritual conhece de sobejo e que, não raro, o faz sofrer acerbamente. O nosso verdadeiro saber não é intelectivo, mas intuitivo, e por isto não é definível, como as coisas do intelecto. O que é definível é incerto, mas o que é certo é indefinível – não há dúvida de que o homem meramente intelectual e não espiritual tachará de absurda esta afirmação, que, no entanto, é uma grande verdade. Posso ter duma realidade espiritual uma experiência interna meridianamente clara e soberanamente certa, e ao mesmo tempo ser totalmente incapaz de a explicar ou definir analiticamente a outros, nem mesmo ao meu próprio Eu intelectual. Paulo de Tarso tentou, durante três decênios, analisar a grande experiência espiritual que tivera, quiçá na fração de um segundo, às portas de Damasco, disse que fora arrebatado ao “terceiro céu”, onde ouvira "árreta rémata" (ditos indizíveis) – mas acaba por confessar, como mais tarde seu grande discípulo Santo Agostinho, que saber da realidade do mundo espiritual é uma coisa, mas defini-la é impossível. Analisar quer dizer “dissolver” – mas como se poderia dissolver o que é indissolúvel, por ser um Todo simples, e não composto? Definir quer dizer pôr "fines", fins, circunscrever de certos limites – mas como se poderia limitar o que é por natureza ilimitado? Definir o infinito é fazê-lo finito, isto é, negá-lo, destruí-lo.

Inteligir (*) é um ato do meu pequeno Eu humano que tenta abranger na sua estreiteza individual a largueza do grande Tu universal.

Intuir não é um ato do Eu individual, mas sim um ato do Tu universal, de Deus, ato esse do qual o meu Eu é o objeto passivo, e não o sujeito ativo, como no caso do inteligir.

No inteligir, o menos pretende abranger o mais, o individual tenta capturar em si o universal – tenta esse absurdo e matematicamente impossível. No intuir acontece o contrário, e por isto é possível e razoável. Em última análise, toda a experiência mística é a mais alta racionalidade, a mais perfeita lógica.


Prof. Huberto Rohden



(*) Temos as palavras “inteligência, intelecto, inteligente”, mas abandonamos o verbo básico “inteligir” (do latim intelligere, ou melhor intellegere, derivado de inter-legere, ler por entre, ou talvez intus-legere, ler por dentro). Julgamos necessário restituir ao vernáculo o verbo inteligir, como também intuir, do latim intueri, ver por dentro, ou propriamente “ser protegido de dentro”, palavra essa que compreende uma verdadeira síntese de experiência mística.



Fonte: do livro "Profanos e Iniciados", Ed. Alvorada, 1990
Fonte da Gravura: Tumblr.com

PROGRESSO NESTE E EM OUTROS MUNDOS - REENCARNAÇÃO


O dístico "Nascer, morrer, renascer ainda, progredir continuamente, tal é a lei" (Kardec) proclama um princípio e uma lei natural correlacionada. O principio é o da reencarnação, meio pelo qual nos é dado cumprir como contingência natural a lei do progresso. A reencarnação traz a ideia da preexistência e da sobrevivência da alma e só assim se pode entender a razão de ser da vida na Terra, sua transitoriedade e o sofrimento, porém reconhecendo a perfeição por destino.

Mas é ainda preciso ligar todo esse raciocínio a uma outra afirmativa de Jesus: "Na casa de meu Pai há muitas moradas; se assim não fosse eu vo-lo teria dito...". Com as moradas outras entende-se outras humanidades e de certa forma acesso a essas outras moradas. Não estamos sós no universo.

Tem-se com isto uma compreensão bem maior da Majestade do Criador Supremo, dando-se sentido à existência, descortinando-lhe a Justiça, onde se configura a condição do mérito contrariamente à do privilégio. Por certo estaríamos indagando da parcialidade de uma justiça bem menor se justiça fosse, em que, numa única existência, selada para sempre a sorte de cada um, as almas viventes teriam diversificadas oportunidades de sofrimento ou gozo, sem poder reconstruir o próprio destino. Tão diferente da realidade explicitada pela doutrina espírita.

Progredir é preciso, é lei. Aleatoriamente pode-se ter ideias diferentes quanto ao progresso. Comporta uma visão imediatista e outra de mais amplos horizontes. Na concepção do homem comum pode ser a conquista de valores transitórios constantes dos bens terrenos, por vezes riquezas, vassalagem, conforto. E nem é condenável que melhoremos de vida e que aspiremos a tanto. Para muitos, aquisição de conhecimentos técnico-profissionais, títulos que destaquem, postos de relevo na sociedade e na política. Serão criaturas úteis quando no bom desempenho desses postos. Mas é necessário considerar também o progresso como conquista inalienável do Espírito não só quando lhe abre as portas da inteligência e da cultura mas também quanto as dos sentimentos enobrecidos. Diremos então de um progresso material, de um progresso intelectual e de um progresso moral, que não marcham nem sempre no mesmo ritmo, é bom lembrar. Pode-se ainda falar do progresso coletivo da Humanidade como um todo, das civilizações, ou isoladamente de um povo, de uma nação, de um grupo, de uma instituição, de uma causa. Há espíritos que se afeiçoam a determinadas tarefas, que se reúnem para cumpri-las, que se especializam no campo da ciência, da técnica, ou em missões de condutores de povos. São grandes almas, muitas vezes, que sacodem a inércia em que se demora a humanidade. Sem o conceito da reencarnação seriam prodígios inexplicáveis os grandes sábios, os grandes inventores, os grandes santos. São naturalmente ajudados por Espíritos Superiores empenhados por sua vez em ajudar o progresso. Executam missões ou concluem tarefas a que se afeiçoaram e em que se aperfeiçoaram. Sem esquecer aquelas almas que passam pela Terra dando o exemplo vivo da humildade, sem destaques, desconhecidas do mundo, mas por si mesmas engrandecidas.

Mas, como vimos, a reencarnação não pressupõe apenas a ideia estritamente terrena de espíritos que convivem conosco neste ou conviveram naquele tempo. Dilata-se-nos o conceito se admitirmos - e por que não? - que outras humanidades se permitem intercâmbio conosco trazendo-nos o fruto de seus avanços e trocando experiências por solidariedade ou por compromissos assumidos para o seu próprio melhoramento. Um gênio extraordinário que se antecipa de milênios à nossa ciência, como é o caso de Leonardo da Vinci, para citar apenas um, não adquiriu na Terra o conhecimento que ela não lhe poderia ter dado por não comportar. Espíritos como esse não só preexistiram com certeza mas trouxeram de outras paragens o aprendizado adquirido quem sabe em escolas superiores do espaço ou em mundos superiores.

Admitir, no entanto, que um cérebro físico, por milagres de disposição neuronial, houvesse produzido o gênio extraordinário que avança além dos estágios da ciência ou da concepção da arte, seria nada esclarecedor e nada convincente. Sem o espírito preexistente, com experiências adquiridas alhures, não se explicariam tantas conquistas que constituem eloquentes registros da História. Aqui a ideia dessa fraternidade e desse intercâmbio interplanetário é um novo aspecto engrandecedor da mensagem espírita. Nessa ordem de considerações as conquistas tecnológicas podem representar experiências trazidas a nós vindas de outras plagas, não tenhamos maiores dúvidas.

As humanidades progridem. Progridem os mundos habitados.


Alberto Souza Rocha



Fonte: do livro "Reencarnação em Foco", Casa Editora O Clarim, Matão, SP
Fonte da Gravura: Grev Kafi (the pseudonym of two symbolist painters, Evdokia Fidel'skaya and Grigoriy Kabachnyi, a married couple, that work in co-authorship) - http://www.grevkafi.org

O DESTINO ESSENCIAL DO SER HUMANO


Enquanto você pensar que pode apenas meditar o suficiente para se dar bem ou o suficiente para conquistar algo, na verdade você não começou a meditar. Quando você se der conta que deu início a uma jornada que irá durar até o fim de sua vida, você terá começado a aprender. A esse momento, de reconhecimento e concordância, chamamos compromisso. Ele é corretamente descrito como um momento de graça e compreensão, porque nele experimentamos nossa mais profunda significação e compreendemos a importância da prece para que estejamos completamente vivos. Meditamos não tanto para entendermos porque estamos vivos quanto para vivermos diferentemente, para vivermos mais completamente. [...]

A própria meditação é uma experiência de aprendizado, literalmente “uma disciplina”. Só a disciplina nos ensinará a verdade e só a prática nos levará a despertar. A disciplina da meditação é uma escola. É uma escola de amor e nosso crescimento nessa escola é crescimento no discipulado do amor. Nos ensina o que precisamos saber, a enxergar com o coração, a viver a partir do centro, a abraçar com todas as fibras de nosso ser. Nos ensina o que precisamos saber para cumprirmos o destino essencial que cada ser humano possui: ser seu eu pela eternidade. O destino humano é o do viver eterno... A maioria de nós começa a meditar num ponto em que parcialmente concordamos com a ideia de vivermos uma vida finita. Todavia, também começamos a compreender que isso foi um erro.

É fácil concordarmos com a ideia de vida finita, porque é uma vida vivida no interior de paredes protetoras. Nos parece estar segura e a salvo... Mas a opção mais desafiadora de todas é a de vivermos eternamente, a de respondermos a mais elevada verdade sobre a existência, a identidade e a morte. A compreensão de que somos feitos para a eternidade extrapola o poder da imaginação, significando não apenas a vida do mundo futuro, mas vida vivida completamente agora. E o estarmos completamente vivos demanda, a todo momento, tudo o que somos. Não admira que depreciemos a maravilha disso e construamos aquelas paredes protetoras... Todavia, a vida é mais forte do que nossos medos... Viver eternamente significa viver integralmente no presente momento. A eternidade é o perpétuo agora, e ao aprendermos a viver eternamente no presente aprendemos a verdade sobre o amor.


Dom Laurence Freeman, OSB



Fonte: "O agora do amar" - Leitura de 15/06/2008
The Selfless Self (London: Darton, Longman and Todd, 1996) pp. 36-37.
Tradução de Roldano Giuntoli
Via Comunidade Mundial de Meditação Cristã - www.wccm.com.br
Fonte da Gravura: Acervo de autoria pessoal