sábado, 25 de novembro de 2023

MEDITAÇÃO E UNIFICAÇÃO NO SUFISMO E CRISTIANISMO


O Método do Sufismo

Os escritos dos Sufis estão muito velados por fantasias e simbolismos e têm um sentido de dualidade mais forte do que talvez em qualquer outro sistema religioso esotérico, à exceção dos escritos místicos Cristãos. Mas aí ressalta também a mesma expressão da verdade e o mesmo método fundamental. É o que extratos do vetusto Tratado Persa sobre o Sufismo nos demonstra. É interessante notar que os escritos mais extensos e que apresentam a maior utilidade tiveram origem naqueles que são os Conhecedores, capazes de contar as suas experiências da divindade de tal modo que podem ensinar e delinear, assim como declarar e afirmar.

"O primeiro passo para a unificação é o aniquilamento da separação porque a separação é a declaração de que se está separado das imperfeições, enquanto que a unificação é a declaração da unidade de uma coisa... Por conseguinte, o primeiro passo para a unificação é negar que Deus tenha um associado e pôr de lado tal associação...

"Temos cinco princípios de unificação: o afastamento da fenomenalidade, a afirmação da eternidade, o abandono dos laços familiares, a separação dos irmãos e o esquecimento do que é conhecido e desconhecido.

"O afastamento da fenomenalidade consiste em negar que os fenômenos tenham conexão com a unificação ou que lhes seja possível alcançar a Sua santa essência; a afirmação da eternidade consiste na convicção de que Deus existiu sempre... ; o abandono dos laços familiares significa, para o noviço, a separação dos prazeres habituais da alma inferior e das formas deste mundo e, para o adepto, a separação das posições sublimes e dos estados gloriosos e dos milagres exaltados; a separação dos irmãos significa o afastar-se da sociedade da espécie humana e o dirigir-se para a sociedade de Deus, dado que qualquer pensamento que não seja o de Deus é um véu e uma imperfeição e, quanto mais os pensamentos de um homem estão associados a outrem que não Deus, mais Deus lhe está velado, porque está universalmente reconhecido que a unificação é a concentração dos pensamentos, enquanto que estar satisfeito com outro que não Deus é um sinal de dispersão do pensamento...” (Nicholson, Reynold A., The Kashf AI-Mahjúb, pp.281-2)

Encontramos ainda estas palavras:

"Um dos Shaykhs diz: são necessárias quatro coisas àquele que ora: a aniquilação da alma inferior, a perda dos poderes naturais, a pureza do coração interno e a perfeita contemplação. A aniquilação da alma inferior não pode ser alcançada senão pela concentração do pensamento; a perda dos poderes naturais apenas pela afirmação da Majestade Divina, o que implica a destruição de tudo o que é diferente de Deus; e pureza do coração interior unicamente pelo amor; e a perfeita contemplação apenas pela pureza do coração interior." (Nicholson, Reynold A., The Kashf AI·Mahjúb, pp.302-3.

Uma vez ainda, temos a mesma verdade.


O Método do Cristianismo

É naturalmente fácil encontrar grande número de textos que ligam o caminho do Conhecedor Cristão ao do seu irmão do Oriente. Eles testemunham a mesma eficácia do método no qual o intelecto é igualmente empregado até aos limites do seu poder e, depois, todo o esforço é suspenso, até se estabelecer uma nova condição do ser e sobrevir um novo estado de consciência.

Santo Agostinho diz:

"Assim como é inefável, na primeira procissão, donde o Filho sai do Pai, assim também existe qualquer coisa de oculto por detrás da primeira procissão, intelecto e vontade".

Meister Eckhart une-se aos Conhecedores Orientais pelas seguintes palavras:

"O intelecto é o mais forte poder da alma e, com isso, a alma assenhoreia-se do bem divino. O livre arbítrio é o poder de saborear o bem divino que o intelecto lhe faz conhecer. A chispa da alma é a luz do reflexo de Deus, que sempre se volta para observar Deus. O arcano da mente é, por assim dizer, a soma de todo o bem divino, de todos os dons divinos, na essência mais íntima da alma, que é como um poço insondável de bondade divina.

"Os poderes mais inferiores da alma deveriam estar consagrados aos poderes superiores da mesma, e estes a Deus; os seus sentidos externos aos internos e estes à razão, o pensamento à intuição, e todos eles à unidade afim de que a alma possa estar só sem que coisa alguma flua para ela que não seja pura divindade, refluindo neste momento para dentro de si mesma.

"Quando a mente de um homem perdeu o contato com todas as coisas, então, e somente então, entra em contate com Deus.

"No influxo desta graça aparece de imediato aquela luz da mente para a qual Deus envia um raio de Seu Esplendor sem mácula. Nesta poderosa luz um mortal está tão acima dos seus semelhantes quanto um homem vivo está acima de sua sombra projetada na parede.

"O homem da alma, transcendendo o seu modo angélico e guiado pelo intelecto, abre caminho até a fonte de onde a alma brotou. O intelecto é deixado de lado com todas as coisas que têm um nome. Assim a alma é absorvida na pura unidade.” (Pfeiffer, Franz, Meister Eckhart, pp.338, 144, 101, 66)

Assim, todas as grandes escolas de meditação intelectual (privadas, nos últimos estágios, de emoções e de sentimento) conduzem ao mesmo ponto. No ponto de vista do Budismo, do Hinduísmo, do Sufismo e do Cristianismo, o fim é fundamentalmente o mesmo: a Unificação com a Divindade; há a mesma transcendência dos sentidos, a mesma concentração da mente no seu mais alto ponto para conduzir o aspirante ao seu objetivo; a mesma entrada no estado de contemplação da Realidade, a mesma fusão em Deus e a consciência da identidade com Deus e a mesma subsequente Iluminação.

Todo sentimento de separatividade desapareceu. A Unidade com o Universo, a Identidade com o Todo conscientizado, a percepção consciente do Eu e a assimilação em plena consciência desperta, quer com a Natureza exterior, quer com a interior - tal é a meta definida do investigador do conhecimento.

O eu, o não-eu e a relação entre ambos são conhecidos como um fato, sem diferenciação. Deus, o Pai, Deus, o Filho e Deus, o Espírito-Santo, são conscientizados como trabalhando harmonicamente em conjunto com uma Identidade - os Três em Um e o Um em Três. Este é o objetivo de todas as escolas onde o místico transcende o sentimento e, em última análise, até o pensamento, para ficar unido ao Todo. Entretanto, a individualidade persiste na consciência, mas está tão identificada com o Todo que desaparece o sentido da separatividade.

Nada mais subsiste senão a Unidade conscientizada.



Alice A. Bailey / Tibetano / Djwhal Khul




Fonte: do livro "Do Intelecto à Intuição". pp. 147-9, 1ª ed., 1984
Tradução da Fundação Cultural Avatar, Niterói/RJ
Fundação Educacional e Editorial Universalista - FEEU, Porto Alegre/RS
Fonte da Gravura: Acervo de autoria pessoal