Jacó acordou do seu sonho e disse: "Na verdade, Iahveh está neste lugar e eu não sabia!" Teve medo e disse: "Este lugar é terrível! Não é nada menos que uma casa de Deus e a porta do céu!" Levantando-se de madrugada, tomou a pedra que lhe servira de travesseiro, ergueu-a como uma estrela e derramou óleo sobre o seu topo. A este lugar deu o nome de Betel, mas anteriormente a cidade se chamava Luso. (Gênesis, 28, 16-19)
Como já vimos, ter uma crise não é incomum; crise é o exercício da mente. Quando ela surge, às vezes inesperadamente, sentimo-nos quase sempre despreparados para enfrentá-la. Sobretudo quando afeta nossos bens materiais definidos em geral como "a minha mulher", "o meu filho", "a minha casa", "a minha empresa", enfim tudo aquilo que julgamos nos pertencer. "A minha mulher me abandonou", "o meu filho está tomando drogas", "a minha casa pegou fogo", "a minha empresa está indo mal" são lamúrias que ouvimos com uma certa assiduidade. "Apesar do tremendo esforço que eu faço para que tudo vá bem". "Eu faço tudo pela minha mulher!" "Eu trabalho 24 horas por dia na minha empresa!" E continua: "Eu estou sofrendo e ninguém me entende, nem os meus amigos." Uma forma comum de desabafo.
Você quer resolver os seus problemas e eles parecem insolúveis. Arrastam-se indefinidamente. A sua vida passa a ser um verdadeiro horror. Nesse horror chega-se bem depressa à depressão onde recorremos, por vezes, à medicação ou, então, à intervenção de um terapeuta competente. Mas o que significa tudo isso? Será um "mal-du-siècle" tal como era morrer de tuberculose na virada de 1900?
Não é assim. Sem dúvida, sempre há muito de uma situação de crise macro -- nacional ou internacional -- que nos afeta diretamente. Ao contrário do homem primitivo, vivemos em crise quase que permanente, senão macro, pelo menos micro... Por outro lado, há algo mais importante a ser compreendido quando do surgimento de qualquer crise: ao passarmos a nos preocupar com ela, esquecemos de nós mesmos. Olha-se para a crise e não se vê mais nada! A metáfora de Jacó existe para nos chamar a atenção para esse esquecimento.
O texto de Mateus... é sintomático. Nós é que somos importantes porque somos o templo. Precisamos cuidar dele antes de mais nada. Esse cuidar de nós mesmos não é um processo egóico. Significa que você precisa cuidar da sua psique, do seu corpo, manter-se saudável para, então, cuidar daquilo que está ao seu redor e que, na realidade, não lhe pertence: a mulher não é sua, nem seu filho, nem a casa e muito menos a empresa.
Observe bem o seu corpo. Ele é provisório; esse templo mal tratado que você arrasta por aí. Basta lembrar que ao morrer você devolverá, com a sua última lufada de ar, aquele pouco que você inspirou pela primeira vez ao nascer. Jacó percebeu, ao acordar do seu sonho, que o lugar terrível era onde ele estava. Porque é o lugar onde ele sempre estaria tal como você está: dentro do seu corpo, onde ele sempre pisa. Não adianta ir ao Tibete, a algum ashram indiano ou então fazer peregrinações mil. Perceba que é aí mesmo onde você está agora, lendo estas linhas, que é o lugar terrível: o lugar de todas as crises! Por essa razão é que você precisa resolver os seus problemas, sem empurrá-los com a barriga.
Resolvendo os problemas é que podemos nos transformar em Israel, vencendo a Ele numa batalha solitária durante uma noite escura. Ainda que saindo da batalha com um ferimento que nos faça arrastar a perna... (Gênesis, 32,23-33). Parafraseando um jurista lúcido: "Afinal, é melhor um fim horroroso do que um horror sem fim!" Portanto, perceba o lugar em que você está e cuide-se! Olhando para dentro de si próprio você encontrará as verdadeiras soluções ou as grandes iniciações.
Leo Reisler
Fonte: do livro "Kabbalah - A Árvore da sua Vida", Ed. Nórdica
Fonte da Gravura: Acervo de autoria pessoal