A meditação afeta a maneira como vivenciamos o bem e o mal mais como realidade e ilusão?
Fr. John: Acho que sim. Acho que o ponto-chave sobre a realidade e a ilusão é que a ilusão é ilusão porque não é real na perspectiva divina. É claro que pode parecer muito real da sua perspectiva. Se alguém prega uma peça ruim em você, você percebe isso como algo muito real. Digamos que alguém roube sua carteira quando você vai às compras. No momento em que você descobre isso, você vê isso como algo muito real. E a pessoa que roubou de você também parece real. Ele agora tem US$ 50 a mais do que tinha. Mas na perspectiva divina, o momento de glória deles acabou, assim como o seu momento de dor quando você descobre que agora tem US$ 50 a menos.
Você se depara com a desagradável verdade de que alguém com certa tendência para o mal lhe causou danos que você não provocou. Se você tiver que lidar com esse mal, deve evitar julgar tudo a partir de uma perspectiva egocêntrica. Só então você poderá perdoar. Tudo isso, de ambos os pontos de vista, é realidade. É a realidade total vista da perspectiva divina na qual está contido cada ponto de vista. Penso que esta é a diferença entre ilusão e realidade; que a realidade tem um significado eterno e inclusivo; a ilusão é uma rápida olhada na panela no fogão. A meditação nos liberta da tendência de acreditar que nosso ponto de vista é único e verdadeiro. Ele faz isso ensinando-nos a renunciar inteiramente aos nossos pensamentos e ideias, em favor da realidade inclusiva de Deus.
Este é um conceito do Oriente?: “Bem, é uma ilusão, meu amigo, que você sofra.” É uma ilusão que existam milhões de pessoas que não têm nada para comer, mas que ficarão satisfeitas mais tarde. Até que ponto podemos falar dessas realidades como ilusões?
Fr. John: Claro, é totalmente real enquanto permanecermos numa posição materialista. Mas se você olhar para isso e se perguntar qual é o significado disso, então você começará a entender o que é real e o que é ilusão. Acho que o problema é que fomos educados para viver numa atmosfera puramente materialista e se alguém roubar a sua carteira, ou mesmo a sua vida, isso parece ser a realidade última.
Se atribuirmos a realidade última à mudança da experiência humana, é muito difícil acreditar que só Deus é real, de modo que todo o resto só é real na medida da nossa participação na realidade.
O mal não pode participar da sua realidade, mas pode participar da limitação. Portanto, podemos abrir nossos corações a Deus com compaixão pelo sofrimento humano. Em outras palavras, a mão que vai atacar age de forma irrealista. A mão que traz conforto atua de forma real, de forma divina. Deus não é indiferente. Deus é bom. Deus é amor.
É difícil compreender através de conceitos, mas isso fica claro na experiência do sofrimento e da compaixão, no bem e no mal. Alguém disse uma vez a W. B. Yeats: “Sr. Yeats, quando leio alguns de seus poemas, não consigo entender o que ele quer dizer. Você poderia me dizer o que eles significam? Yeats respondeu: “Talvez eu possa lhe dizer o que significam, mas o que sei é que são absolutamente reais para mim. O que devo conseguir para vocês através dos meus poemas, se possível, é que para mim isso é absolutamente importante. Talvez eu não consiga explicar o que eles significam (porque talvez eu nem saiba), mas tenho certeza de que é importante."
Grande parte da teologia cristã funciona assim. Penso então que é a importância da meditação, que nos dá, por assim dizer, o instinto do que é certo, ou a perspectiva do que é certo na visão eterna de Deus. Só podemos saber disso no momento da visão beatífica. Ver Deus é ver tudo como Ele vê e como Ele conhece.
Fr. John Main, OSB
Fonte: do livro "O Coração da Criação", Canterbury Press, 2007
Traduzido para o espanhol por Lucía Gayón, e para o português por este blog.
PERMANECER EN SU AMOR - Coordenadora: Lucía Gayón - Ixtapa, México
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Fonte da Gravura: Acervo de autoria pessoal