terça-feira, 27 de maio de 2025

A AVENTURA DE DESCOBRIR QUEM SOMOS


Se em vez de nos chamarmos pelo nosso nome, nos chamássemos de outra coisa, ainda seríamos nós? E se morássemos em outro lugar? Se tivéssemos outra profissão?... O que nos faz continuar a ser eu, apesar das possíveis variáveis? O que significa ser eu?

Segundo o psicoterapeuta e ensaísta suíço C. Gustav Jung, o Self é o centro interno do ser humano que inclui o consciente e o inconsciente, e corresponde simplesmente a ser, a ser autenticamente, a estar no centro. Mas o Eu deve coexistir com o ego, o núcleo consciente da pessoa, que é responsável por se apresentar, brilhar, viver as suas próprias necessidades e colocar-se no centro. Não há, portanto, uma pequena diferença entre “ser” e “posicionar-se” no centro.

Do ego vêm os nomes egoísmo, egomania, egocentrismo etc. Uma série de termos que têm muito a ver com mau relacionamento com os outros, arrogância, manipulação, confundir o pensamento com a verdade absoluta, vontade de impor a nossa forma de ver as coisas...

Mas, em si, o ego não é algo repreensível. É, em grande parte, constituído pelo conjunto de papéis que desempenhamos no “grande teatro do mundo”, e que os vestimos com diferentes ‘trajes’ que poderiam ser adaptados a cada um dos papéis.

O ego faz parte de nós, constitui o suporte da nossa personalidade: apresentamos-nos como engenheiros, educadores, médicos etc. Destacamos os nossos méritos acumulados quando vemos o nosso prestígio atacado ou consideramos oportuno reconhecer o nosso valor etc. E, na realidade, tudo isso nos pertence, mas não constitui o nosso verdadeiro ser.

Quando olhamos para o nosso passado, em relação ao presente, percebemos que muitas coisas mudaram em cada um de nós: aparência física, capacidades físicas e intelectuais, interesses, hobbies etc., mas permanece algo que nos torna conscientes de continuar sendo o mesmo.

Eu sou eu e minhas circunstâncias, disse Ortega; e esse Eu, ao contrário das nossas circunstâncias, é o que permanece vivo, enquanto elas mudam ou desaparecem.

Pelo contrário, o ego não tem vida própria. É algo que se 'gruda' no eu para poder participar da sua vida, porque 'sabe' que não vai sobreviver, que vai morrer quando a nossa dimensão humana neste mundo desaparecer, como Teilhard de Chardin o disse. É por isso que precisa alimentar-se continuamente dos subterfúgios do poder, das posses e da fama, para ganhar a ilusão tola de participar da imortalidade do Eu.

Mas não vamos sobrecarregar o ego com culpas que não lhe pertencem. Devemos representar os papéis que nos foram atribuídos nesta vida de forma profissional e honesta. O que nos traz dificuldades, insatisfação e infelicidade é a identificação com o nosso ego que pode ter sido colocado no centro, pois assim teríamos suplantado o nosso Eu pelo papel que estou desempenhando.

Comentando as parábolas do tesouro escondido e da pérola preciosa, como imagens que representam a si mesmo, o beneditino Anselmo Grün vem nos contar algo que pode nos ajudar a compreender a aventura que temos considerado: o tesouro e a pérola são imagens que representam o verdadeiro Eu.

O tesouro está enterrado no campo. Devemos chegar às profundezas da terra, para lá encontrá-lo: cavar no campo das nossas almas, e também no corpo do nosso ser humano porque o nosso Eu se expressa no nosso corpo. Se alguém se tornou ele mesmo, podemos ver isso em seu comportamento e em sua maneira de se comunicar com os outros.

A imagem da pérola preciosa, pela qual um comerciante vende os seus bens para comprá-los, tal como no caso do tesouro, mostra-nos outro caminho para o verdadeiro Eu. A pérola cresce nas feridas da ostra. Trata-se justamente de descobrir as pérolas nas feridas da própria história de vida, porque esse é o nosso verdadeiro Eu, sabendo também que, se descobrimos a pérola, a ferida deixa de doer.

Quão importante deve ser descobrir quem somos, e o comportamento mais inteligente que estas parábolas sugerem é "vender tudo o que temos" para “comprar” o que acabamos de descobrir.

Já no século IV aC. C., Sócrates disse: conheça a si mesmo e conhecerá o universo e os deuses. Uma grande aventura que temos ao nosso alcance.


Ignácio Gallego



Na verdade, toda a nossa peregrinação espiritual se resume em sermos capazes de responder à pergunta: Quem somos nós? (comentário da Comunidade Meditação Cristã)

Artigo publicado em 01/02/2023 no ABC de Sevilha.

Fonte: WCCM Espanha - Comunidad Mundial para la Meditación Cristiana
http://wccm.es/
Traduzido por WCCM España e para o português por este blog.
Fonte da Gravura: https://pixabay.com/pt/photos/budismo-theravada-freiras-medita%C3%A7%C3%A3o-3818886/


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