Todos nós estamos procurando por algo. Alguns têm uma noção clara disso ou, pelo menos, uma consciência, um despertar consciente daquilo que lhes falta. Mas na maioria das vezes e para a maioria de nós, é uma dor surda, uma vaga saudade que permanece conosco, tanto nos momentos bons quanto nos momentos difíceis. “Minha alma está inquieta, até que repouse em ti”, foi a expressão de Santo Agostinho para descrever esse anseio pela plenitude, pela ressurreição que transcende o ciclo de nascimento e morte do desejo. Vista assim, essa saudade não é uma aflição e sim uma dádiva, pois quando a reconhecemos, encontramos o recanto que leva ao caminho espiritual. Na nossa cultura atual, condicionada desde a infância pelo consumismo, esta compreensão do desejo deveria ser o centro de todo sistema educativo religioso.
As livrarias estão repletas dos mais recentes conselhos de autoajuda. Livros sobre temas como administrar a autocrítica, expressar sentimentos, desenvolver uma vida equilibrada, alimentação saudável ou a importância do exercício físico aparecem nas listas de mais vendidos. O melhor tema que conheço encontra-se num livro que não está no topo de nenhuma dessas listas e cuja edição não está esgotada há 1.500 anos. Na Regra de São Bento, o quarto capítulo fala dos “instrumentos das boas obras”: setenta e cinco breves afirmações que descrevem os “instrumentos do trabalho espiritual” que, quando verdadeiramente aplicados, conduzem à realização transcendente das promessas de Cristo: “ O olho não viu, nem o ouvido ouviu, o que Deus preparou para aqueles que o amam.”
Os instrumentos começam com os dez mandamentos porque a vida moral é o fundamento do caminho contemplativo. Em seguida vêm as obras de misericórdia corporais, o esforço mínimo que devemos fazer para o bem-estar dos outros. Em seguida, descreve a proteção do coração contra pensamentos de raiva, vingança ou engano. Enquanto vivia em comunidade, São Bento compreendeu a importância de exercitar o sentimento de amor pelos inimigos e como o autocontrole da linguagem e dos nossos hábitos físicos comuns facilita esta prática cristã básica. A atenção plena nos ajuda a manter a morte diante de nossos olhos e promove um nível mais profundo de paz e alegria. A tentação do egoísmo espiritual também é descrita nos conselhos de Bento e é compensada pelo desejo contínuo da plenitude da vida.
Essas ferramentas para praticar boas ações também são uma forma de cuidar de si mesmo. Toda forma de cuidado é uma energia de fé, pois desvia a atenção dos próprios desejos e sentimentos e os transfere para um bem maior. Portanto, é uma forma de transcendência. Perdura no tempo, o que comprova a sua autenticidade e sinceridade. É, portanto, um caminho de transformação em que mudamos perseverando num ato de fé.
Todos os instrumentos descritos por Bento, incluindo o autocuidado, são definidos para desenvolver e libertar a nossa capacidade de amar. A repetição do mantra unifica muitas formas de cuidado. Concentra-os no centro do coração onde mora o amor de Deus.
Trecho de “Dear Friends”, de Laurence Freeman, OSB, Christian Meditation - Newsletter (Vol. 35, No. 2, julho de 2011, p. 5).
Transcrição de Carla Cooper
Fonte: WCCM Espanha - Comunidad Mundial para la Meditación Cristiana
http://wccm.es/
Traduzido por WCCM España e para o português por este blog.
Fonte da Gravura: IA (AI)