A religião como geralmente conhecemos ou reconhecemos, é uma série de crenças, de dogmas, de rituais, superstições, adoração de ídolos, de fetiches e gurus que o levarão ao que você quer como meta final. A verdade final é sua projeção, é isso que você quer, que o fará feliz, que lhe dará uma certeza do estado imortal. Assim, a mente presa em tudo isto cria uma religião, uma religião de dogmas, de habilidades sacerdotais, de superstições e adoração de ídolos e nisso você está preso, e a mente fica estagnada. Isso é religião? Religião é uma questão de crença, uma questão de conhecimento das experiências de outras pessoas e afirmações? Ou religião é meramente seguir a moralidade? Você sabe que é comparativamente simples ser moral para fazer isto e não fazer aquilo. Porque é fácil, você pode imitar um sistema moral. Por trás dessa moralidade, espreita o ego, crescendo, se expandindo, agressivo, dominador. Mas isso é religião? Você tem que descobrir o que é verdade porque essa é a única coisa que interessa, não se você é rico ou pobre, não se você está bem casado e tem filhos, porque todos eles chegam ao fim, existe sempre a morte. Assim, sem nenhuma forma de crença, você deve descobrir; você deve ter o vigor, a autoconfiança, a iniciativa, de modo que por si mesmo você saiba o que a verdade é, o que Deus é. A crença não vai lhe dar coisa alguma; a crença apenas corrompe, cega, obscurece. A mente só pode ser livre pelo vigor, pela autoconfiança.
Organizações religiosas se tornam tão fixas e rígidas como os pensamentos daqueles que pertencem a elas. A vida é uma mudança constante, um contínuo se tornar, uma revolução incessante, e porque uma organização não pode ser flexível, ela fica no caminho da mudança; ela se torna reacionária para se proteger. A busca da verdade é individual, não congregacional. Para comungar com o real deve haver solidão, não isolamento, mas liberdade de toda autoridade e opinião. Organizações de pensamento se tornam, inevitavelmente, obstáculos para o pensamento. Como você mesmo está ciente, a ganância por poder é quase inesgotável em uma chamada organização espiritual; esta ganância é encoberta por todos os tipos de palavras doces e autorizadas, mas o câncer da avareza, do orgulho e do antagonismo é nutrido e partilhado. Daí cresce o conflito, a intolerância, o sectarismo, e outras manifestações horríveis. Não seria mais sábio ter pequenos grupos informados de vinte ou vinte e cinco pessoas, sem obrigações ou associação, encontrando-se onde for conveniente para discutir calmamente a abordagem da realidade? Para impedir que algum grupo se torne exclusivo, cada membro poderia de tempos em tempos encorajar e talvez participar de outro pequeno grupo; assim, ele seria extensivo, não estreito e paroquial. Para subir alto deve-se começar baixo. A partir deste pequeno começo a pessoa pode ajudar a criar um mundo mais sensato e feliz.
O que está acontecendo no mundo? Vocês têm um Deus cristão, deuses hindus, maometanos com sua concepção particular de Deus, cada pequena seita com sua verdade particular; e todas estas verdades estão se tornando como muitas doenças no mundo, separando pessoas. Estas verdades, nas mãos de poucos, estão se tornando meios de exploração. Você vai de uma para outra, testando todas elas, porque começa a perder todo o senso de discriminação, pois está sofrendo e quer um remédio, e você aceita qualquer remédio oferecido por qualquer seita, seja cristã, hindu, ou qualquer outra seita. Então, o que está acontecendo? Seus deuses estão dividindo vocês, sua crença em Deus está dividindo vocês e, contudo, você fala de fraternidade do homem, unidade em Deus, e ao mesmo tempo nega a própria coisa que você quer descobrir, porque você se prende a estas crenças como o meio mais poderoso de destruir a limitação, ao passo que elas só intensificam isto. Estas coisas são tão óbvias.
Você sabe o que é religião? Não é o canto, não é a execução do “puja”, ou algum outro ritual, não é a adoração de deuses de metal ou imagens de pedra, não está nos templos e igrejas, não está na leitura da Bíblia ou do Gita, não é a repetição de um nome sagrado ou seguir alguma outra nova superstição inventada pelos homens. Nada disto é religião. Religião é o sentimento de bondade, aquele amor que é como o rio, vivendo, se movendo eternamente. Nesse estado você descobrirá que chega um momento em que não há absolutamente mais busca; e esse fim da busca é o começo de uma coisa inteiramente diferente. A busca por Deus, pela verdade, o sentimento de ser completamente bom – não o cultivo da bondade, da humildade, mas a procura de alguma coisa além de invenções e truques da mente, o que significa ter um sentimento por aquele algo, viver nele, estar nele – isso é verdadeira religião. Mas você só pode fazer isso quando sair da poça que cavou para si mesmo e entrar no rio da vida. Então a vida tem uma forma surpreendente de tomar conta de você, porque então não há você tomando conta. A vida leva você aonde for, pois você é parte dela mesma; então não existe problema de segurança, do que as pessoas vão dizer ou não dizer, e essa é a beleza da vida.
J. Krishnamurti
Fonte: The Book of Life
http://www.jkrishnamurti.org/pt
Fonte da Gravura: Acervo de autoria pessoal