sábado, 30 de novembro de 2013

UMA CHAMA DE SABEDORIA (CHANUKÁ)

A comunidade judaica celebra Chanuká, nossa festa das luzes. Embora os eventos que comemora sejam muito antigos, sua mensagem continua poderosa e atual.

Superficialmente, Chanuká é sobre as grandes batalhas pela liberdade religiosa. No terceiro e segundo séculos AEC, Israel tinha permanecido sob o domínio do Império Alexandrino – primeiro os Ptolomeus no Egito, depois os Selêucidas na Síria. Um governante selêucida, Antiochus IV, procurou forçar o ritmo da helenização.

Sob um sumo sacerdote em Jerusalém, Jason, os membros do sacerdócio passavam mais tempo no atletismo que servindo a D’us. Sob seu sucessor ainda mais helenizado, Menelau, foi erigida uma estátua de Zeus Olimpo no recinto do Templo. A prática pública do Judaísmo foi banida. Isso era demais para os judeus que continuavam fiéis à sua fé, e um pequeno grupo, liderado por um sacerdote idoso, Matathiyahu, se revoltou.

Num período de três anos, eles tinham derrotado os selêucidas, restabelecido a soberania judaica e rededicado o Templo. Foi uma vitória impressionante, e teve consequências históricas mundiais. Era o início do fim da Grécia como poder imperial. Porém, se isso tivesse sido tudo, não haveria judaísmo hoje, nem cristianismo e nem islamismo.

Para defender um país, você precisa de um exército. Mas para defender uma civilização, precisa de escolas.

O motivo é que a vitória militar não durou. Dentro de um século, Israel estava novamente sob jugo estrangeiro – dessa vez de Roma. Menos de 150 anos depois, após uma desastrosa rebelião, Jerusalém foi derrotada e o Templo estava em ruínas. Documentos daquela época nos contam que havia muitos judeus acreditando que Chanuká não podia mais ser celebrada. Era nula e vazia. O triunfo anterior fora substituído pela tragédia.

Foi então que um pequeno detalhe da rededicação adquiriu um novo significado. Procurando entre os destroços do templo profanado, os judeus descobriram uma única ânfora de azeite com o selo intacto. Isso permitiu que eles acendessem o candelabro do Templo, a menorá. Milagrosamente, durou oito dias, até que o novo azeite pudesse ser preparado. Aquilo se tornou a base do nosso costume de acender um candelabro em nossos lares durante oito dias, nessa época do ano.

A menorá simbolizou algo bem diferente da vitória militar. Representava fé, esperança, lealdade, coragem. Os judeus começaram a entender que o verdadeiro conflito entre o Antigo Israel e a Antiga Grécia não era político, mas cultural. Para defender um país, você precisa de um exército. Mas para defender uma civilização, precisa de escolas.

Lembrando da ênfase bíblica na educação, os judeus começaram a criar o primeiro sistema de educação pública universal da história. Em torno do final do primeiro século, estava completo. Os judeus se tornaram o povo que baseou sua sobrevivência na casa de estudo. Seus heróis eram mestres, e suas cidadelas, as escolas. A partir daquele dia até hoje, eles fizeram da educação sua maior prioridade comunitária. Isso permitiu que fizessem o que nenhuma outra nação tinha feito – preservar sua identidade intacta através de quase vinte séculos de exílio, dispersão e ausência de poder.

Chanuká conta uma história que fala ao nosso tempo. Em anos recentes as notícias têm sido dominadas por conflitos étnicos, terror e guerra. A História, no entanto, sugere uma narrativa diferente. A curto prazo, a violência faz as manchetes. Mas a longo prazo, não é isso que importa. O que faz a diferença é aquilo que ensinamos aos nossos filhos. As civilizações sobrevivem menos pela força de suas armas que pela força de seus ideais, e sua capacidade de transmiti-los às futuras gerações.

A mensagem de Chanuká é simples. O que perdura não é a vitória no campo de batalha, mas a vela da esperança que acendemos na mente de uma criança.

O que o mundo contemporâneo está ensinando às suas crianças? Nos países em desenvolvimento, há grandes porcentagens de analfabetismo. Em zonas de conflito, as crianças estão sendo ensinadas a odiar aqueles com quem um dia terão de aprender a conviver. Em muito poucos países estão sendo ensinados os princípios da liberdade, responsabilidade e respeito pela diferença. A mensagem de Chanucá é simples. O que perdura não é a vitória no campo de batalha, mas a vela da esperança que acendemos na mente de uma criança.

Chanuká aconteceu há muitos anos, ou está acontecendo agora?

Olhando para os eventos de hoje, você começa a se perguntar. A história de uma pequena vela expulsando o monstro da assustadora escuridão, da sensibilidade humana vencendo o terror e a força bruta, da vida e crescimento superando a destruição – a batalha está muito viva dentro de cada um de nós, e no mundo que nos cerca.

Afinal, a vitória da luz sobre as trevas é o megadrama cósmico – a eterna história de tudo que é. Ocorre novamente em todo solstício de inverno, a todo amanhecer de cada dia, com todo fóton de luz do sol que irrompe pela atmosfera da terra, trazendo seu calor e energia de vida. Com cada sopro de vida, cada grito de uma criança recém-nascida, toda folha de grama que brota no solo. Com todo lampejo de gênio, cada lance de beleza, toda decisão de fazer o bem em face do mal, de ser bom onde há crueldade, de construir onde outros destroem, de levar a humanidade para a frente quando outros a puxam na direção do caos.

E isso é Chanuká.

Chanuká é mais que um feriado; Chanuká é uma jornada espiritual de oito dias. Muitas pessoas conhecem a história de Chanuká – mas apenas como um pretexto histórico para dar presentes e comer latkes. Podemos chamar isso de corpo de Chanuká. A alma de Chanuká é a sua meditação, júbilo, calor e luz. Não apenas a celebramos em nossos lares com nossos entes queridos, mas com o mundo inteiro.





Rabino Jonathan Sacks




Fonte do Texto e da Gravura: Boletim Rua Judaica
http://www.ruajudaica.com/

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