sexta-feira, 29 de janeiro de 2021

ESTUDO PSICOLÓGICO BUDISTA DAS EMOÇÕES


...O Budismo desenvolveu um estudo psicológico extremamente sutil das emoções, e eu gostaria de resumir rapidamente estes estudos.

Suponhamos que estou sentada no meu mosteiro na França, fora de casa em frente a uma pequena estrada. De repente vejo alguma coisa que vem por este caminho, e neste instante surge minha percepção, a visão. Primeiro vejo que é uma forma e percebo que é um ser humano, não um animal. À medida que se aproxima posso distinguir se é um homem ou uma mulher. Até então eu estava usando apenas a percepção visual, mas a partir do momento em que eu distingo esta pessoa começo a pensar se a conheço ou não. Agora surgem as emoções, então, ou eu me sinto contente ao encontrar esta pessoa, ou não me sinto nada contente em encontrá-la. Podemos imaginar que se gosto desta pessoa vou me alegrar, vou ser amável, sorrir. Mas se estou de mau humor, ou se é uma pessoa desagradável para mim vou me sentir decepcionada com a perspectiva deste encontro. Se é uma pessoa que me desgosta, que não aprecio, eu já começo a fazer caras e mesmo antes de encontrá-la crio uma maneira de recebê-la e preparo o espírito para o nosso encontro. Num instante passo por toda uma gama de emoções e sentimentos que se refletem no meu rosto. E tudo isto se passa em mim, pois a pessoa ainda está longe, mas nossa relação já esta contaminada pelos meus sentimentos...

E é assim que se forma o carma. Carma é um verbo que vêm do sânscrito e que significa "fazer". O carma é uma consequência das nossas palavras, dos nossos atos e dos nossos pensamentos...

Existe outro termo, muito importante no Budismo, que em sânscrito é "sanskara". Sanskara são as formações mentais, é exatamente o que aparece em mim no momento em que penso "eu conheço esta pessoa e não gosto dela." Nós temos uma tendência a agir, a pensar ou a falar em função de nossas lembranças, de nossas projeções mentais. Mas devemos ver que este carma somos nós mesmos que criamos a cada instante, não é alguma coisa fatal, que foi fixada anteriormente e da qual possamos dizer: "não posso fazer nada, é meu carma." Não posso de maneira nenhuma agir sobre o fato de que existe uma pessoa se aproximando, mas sou completamente livre quanto a minha reação face a ela. Podemos pensar que não somos livres, podemos achar que é normal estarmos irritados, com raiva depois de tudo o que aquela pessoa nos disse no nosso último encontro. Mas isto também é uma formação mental. É a nossa reação, e neste momento estamos dando andamento ao nosso carma e acrescentando algum sentimento passado a esta relação atual. Por isso é importante perceber que podemos reagir com liberdade, sem estarmos presos a recordações do passado.

Talvez eu também possa pensar que esta pessoa desconhecida que se aproxima, que eu não conheço, venha para me matar em função de seu carma passado, que eu desconheço. Mas mesmo assim sou livre, completamente livre na minha reação. Posso morrer sentindo ódio, raiva e recriar o mesmo carma, ou posso simplesmente aceitar as coisas como elas acontecem. O que dificulta tudo é que as emoções são extremamente atraentes, mesmo e sobretudo a raiva. Nas palavras de Buda a raiva é o primeiro veneno. Mas os momentos em que estamos com raiva são extremamente gratificantes. Nos sentimos cheios de razão, cheios de direitos: "realmente tenho razão em sentir tanta raiva", e nos sentimos muito bem em ferir e em lançar esta raiva contra as outras pessoas, que achamos que nos fizeram isto ou aquilo. Nós ficamos cheios de satisfação. E a cólera é uma emoção que sentimos frequentemente durante a meditação. Ficamos cheios de raiva contra alguém que nos vem à lembrança, ou contra uma situação da nossa vida, ou contra nós mesmos.

Durante a meditação, apesar de tentarmos evitar o que fizemos no nosso dia a dia, vamos poder reconhecer a cólera, e aceitá-la. Não vamos sucumbir à cólera como fazemos na vida cotidiana.

Nós nos sentimos bem com as nossas emoções porque é com elas que nos sentimos vivos. Vinculamos a sensação de estar vivo ao fato de experimentar emoções, alegria, tristeza, raiva. Penso que é por isso que vamos ver filmes tristes, para poder chorar, para poder sentir emoções. Achamos que se não tivermos mais emoções não seremos mais humanos, seremos como uma pedra. Mas durante a meditação começamos a compreender o que são realmente as emoções, começamos a perceber que elas são impermanentes e transitórias, baseadas nas formações mentais, no nada, no vazio.


Zuymyo Joshin Sensei



Fonte: Excertos do texto "Zen e a Transformação Interior" (a fonte é desconhecida)
Fonte da Gravura: https://pixabay.com/pt/photos/nascer-do-sol-ioga-natureza-3848628/

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