segunda-feira, 18 de dezembro de 2023

AS BÊNÇÃO DO NATAL


Ainda pairam sob os céus sombreados de expectativas dolorosas da criatura humana os estupores inexoráveis das possibilidades da guerra de extermínio total, em face da alienação que se apossa de homens e governos arbitrários, em ludíbrio dos lídimos valores da existência, na sua desventurada volúpia de dominação equivocada.

Não saturado das inditosas jornadas bélicas, em que os povos se levantaram nas cidades em escombros, assinalados por inomináveis anarquias, e a orfandade defluente das lutas se transformou em homens cépticos e desiludidos, insta-se, na Terra, pela vigência dos estados alucinatórios de indivíduos e grupos, que avançam, galopantes, sobre o corcel do prazer e do pavor, com que escravizam e a que se submetem inermes.

As ambições de um dia, não obstante passem, deixando cinzas e aflições, fascinam as mentes desarvoradas que assomam, de quando em quando, em toda parte, gerando as dores superlativas que são obrigadas a carpir, posteriormente, graças às inderrogáveis leis da Soberana Justiça.

Fadado ao bem e atraído pela beleza, o homem não se conscientizou, por enquanto, do nobre fanal do amanhã, atado aos liames do atavismo das injunções anteriores donde procede...

O poder da força constitui-lhe recurso soberano para a aquisição de uma felicidade que se converte em taça de veneno que sorve, em inominável desesperação...

As suas conquistas, que impulsionam o progresso tecnológico e poderiam fomentar as legítimas aspirações dos ideais superiores, são convertidas em armas de destruição, em vãs tentativas de domínio sobre os outros, em razão da momentânea impossibilidade de dominar-se a si mesmo, sem dúvida tarefa mais grave e mais difícil.

Em tal empresa não se dá conta que o triunfador, não raro tomba sobre o vencido, com ele sucumbido e passando na voragem devoradora do tempo...

Para modificar, porém, a arcaica estrutura do homem-fera, tornando-o criatura-anjo, veio Jesus. Revolucionário do amor, viveu a apoteose da renúncia e do auto-encontro, com que logrou encontrar todas as criaturas.

Não obstante o abutre da dominação romana que sobrevoava o cadáver das civilizações e povos vencidos, Ele instituiu o código dos direitos humanos, já insculpido nas consciências pela determinação divina, em vibrante apelo pela paz de todos.

Utilizando-se do cenário da Natureza, compôs a mais comovedora sinfonia de esperança, e, na cátedra natural de um monte, apresentou a regra áurea para a Humanidade, através dos robustos e desafiadores conceitos insertos nas bem-aventuranças...

Dignificou um estábulo e sublimou uma Cruz...

Exaltou um grão pequenino de mostarda e repudiou a hipocrisia dourada dos poderosos em trânsito para o túmulo, quanto a pusilanimidade bafiosa, embora disfarçada dos corifeus da ilusão mentirosa...

Conviveu com a ralé, e, trabalhando-a, logrou fazer heróis e santos, servidores incansáveis e ases da abnegação...

Sua palavra, seus feitos, seus silêncios estoicos dividiram os tempos e os fastos da História.

Colocou-se fora dos tempos, num tempo permanente, sem ontem, num momentoso hoje-amanhã...

Quase vinte séculos se passaram depois d'Ele, e, no entanto, tão próxima destes dias está a Sua vida!

As circunstâncias eram, então, quase as mesmas. Afinal, o homem tem sido o explorador doutro homem, o mais fraco, aquele que lhe tomba à frente...

Eis porque as bênçãos do Natal de ontem são convite vigoroso para que te deixes penetrar pela Sua mensagem nestes dias difíceis, permitindo que Ele volte a nascer nas províncias da tua alma.

O Natal é a história do maior amor que jamais esteve na Terra. Recordá-lo significa impregnar-te do seu conteúdo feliz e ungir-te de abnegação e esforço, de modo a modificares as ásperas situações da atualidade, iniciando esse mister no imo e ampliando-o na direção dos sofredores que espiam a tua abundância com olhos enevoados pela cortina das lágrimas e pelos pesados crepes da dor.

Face ao dia em que Jesus nasceu e acenou com as possibilidades de um homem novo e de um mundo melhor, celebra a tua comunhão com a concórdia e a fraternidade, fazendo a outrem o que gostarias que ele te fizesse neste Natal.



Divaldo P. Franco / Joanna de Ângelis



Fonte: do livro "Rumos Libertadores"
Livraria Espírita "Alvorada" - Editora, Salvador/BA, 1978
Fonte da Gravura: https://pixabay.com/pt/photos/estrela-advento-natal-6803666/


Notas:
Estupor - feiura/mau aspecto
Inexorável - inabalável
Ludíbrio - engano
Lidimo - autêntico
Volúpia - luxúria
Inditoso - infeliz
Defluente - decorrente, consequente
Corcel - ágil (cavalo)
Inerme - indefeso, inofensivo
Assomar - aparecer, mostrar
Atavismo - herança
Injunção - exigência
Inserto - inserido
Pusilanimidade - falta de coragem
Bafioso - exagerado
Corifeu - destaque
Estoico - fiel, firme
Fastos - ostentação, luxo
Imo - âmago
Crepe - tecido

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