terça-feira, 19 de setembro de 2023

SAUDADE DE ALGO QUE NOS "FALTA"


Todos nós estamos procurando por algo. Alguns têm uma noção clara disso ou, pelo menos, uma consciência, um despertar consciente daquilo que lhes falta. Mas na maioria das vezes e para a maioria de nós, é uma dor surda, uma vaga saudade que permanece conosco, tanto nos momentos bons quanto nos momentos difíceis. “Minha alma está inquieta, até que repouse em ti”, foi a expressão de Santo Agostinho para descrever esse anseio pela plenitude, pela ressurreição que transcende o ciclo de nascimento e morte do desejo. Vista assim, essa saudade não é uma aflição e sim uma dádiva, pois quando a reconhecemos, encontramos o recanto que leva ao caminho espiritual. Na nossa cultura atual, condicionada desde a infância pelo consumismo, esta compreensão do desejo deveria ser o centro de todo sistema educativo religioso.

As livrarias estão repletas dos mais recentes conselhos de autoajuda. Livros sobre temas como administrar a autocrítica, expressar sentimentos, desenvolver uma vida equilibrada, alimentação saudável ou a importância do exercício físico aparecem nas listas de mais vendidos. O melhor tema que conheço encontra-se num livro que não está no topo de nenhuma dessas listas e cuja edição não está esgotada há 1.500 anos. Na Regra de São Bento, o quarto capítulo fala dos “instrumentos das boas obras”: setenta e cinco breves afirmações que descrevem os “instrumentos do trabalho espiritual” que, quando verdadeiramente aplicados, conduzem à realização transcendente das promessas de Cristo: “ O olho não viu, nem o ouvido ouviu, o que Deus preparou para aqueles que o amam.”

Os instrumentos começam com os dez mandamentos porque a vida moral é o fundamento do caminho contemplativo. Em seguida vêm as obras de misericórdia corporais, o esforço mínimo que devemos fazer para o bem-estar dos outros. Em seguida, descreve a proteção do coração contra pensamentos de raiva, vingança ou engano. Enquanto vivia em comunidade, São Bento compreendeu a importância de exercitar o sentimento de amor pelos inimigos e como o autocontrole da linguagem e dos nossos hábitos físicos comuns facilita esta prática cristã básica. A atenção plena nos ajuda a manter a morte diante de nossos olhos e promove um nível mais profundo de paz e alegria. A tentação do egoísmo espiritual também é descrita nos conselhos de Bento e é compensada pelo desejo contínuo da plenitude da vida.

Essas ferramentas para praticar boas ações também são uma forma de cuidar de si mesmo. Toda forma de cuidado é uma energia de fé, pois desvia a atenção dos próprios desejos e sentimentos e os transfere para um bem maior. Portanto, é uma forma de transcendência. Perdura no tempo, o que comprova a sua autenticidade e sinceridade. É, portanto, um caminho de transformação em que mudamos perseverando num ato de fé.

Todos os instrumentos descritos por Bento, incluindo o autocuidado, são definidos para desenvolver e libertar a nossa capacidade de amar. A repetição do mantra unifica muitas formas de cuidado. Concentra-os no centro do coração onde mora o amor de Deus.


Trecho de “Dear Friends”, de Laurence Freeman, OSB, Christian Meditation - Newsletter (Vol. 35, No. 2, julho de 2011, p. 5).



Transcrição de Carla Cooper




Fonte: WCCM Espanha - Comunidad Mundial para la Meditación Cristiana
http://wccm.es/
Traduzido por WCCM España e para o português por este blog.
Fonte da Gravura: IA (AI)

Nenhum comentário:

Postar um comentário