quinta-feira, 23 de julho de 2020

ENTRE O AMOR E O MEDO


A diferença entre nosso estado mental quando estamos amando, quando comparado com nossa atitude quando estamos em estado de medo ou isolamento é algo que todos conhecemos. O amor evoca um espírito de felicidade na vida; evoca sua diversidade, sua imprevisibilidade, seu colorido. Quanto mais generosamente permitirmos que esse espírito de amor se expanda em nosso interior, tanto mais nos tornamos centrados no outro; tanto mais encontramos nossa perfeição no outro, nossa realização no outro. É nessa experiência que abandonamos nossa auto-consciência e descobrimos nossa verdadeira consciência. Nós a descobrimos em contato com uma outra consciência verdadeira. É desse encontro que surge a energia criativa que nos permite trabalhar inegoisticamente, amorosamente.

À medida em que lemos o Evangelho vemos que há uma escolha diante de nós. A alternativa é entre o amor e o medo. O medo é destrutivo e corrosivo, seja ele medo de doença, guerra ou fome, seja medo do sobrenatural, de deuses raivosos e vingativos que precisam ser aplacados com rituais compulsivos. A diferença entre o mundo bárbaro e o civilizado é que a barbárie prospera no medo. A civilização prospera no amor que impulsiona o vigor, a energia, a vitalidade e a criatividade. A energia bárbara é negativa; seu principal impulso é destrutivo e sua principal arte é a guerra. A principal arte da vida cristã é a paz.

Nosso compromisso com a meditação é nossa abertura para a paz do amor redentor de Deus, nossa total aceitação dele, nossa renúncia à auto fixação e nosso compromisso com a auto-entrega. Enquanto estamos repetindo nosso mantra, não podemos ficar pensando em nós e é precisamente a auto-obsessão que nos reconduz à fantasia. Assim, quando percebemos que paramos de repetir o mantra, que nossa mente está divagando, devemos simplesmente retornar a ele e, com ele, para a realidade. Isto é, retornar para Deus presente em nossos corações. Em outras palavras, retornamos para uma fé que nos impulsiona para além de nós mesmos, para Deus. Todos nós sabemos que esta auto-transcendência é nossa salvação. Fundamentalmente, todos nós sabemos que precisamos encontrá-la no silêncio de nossos corações. As alternativas são, realidade ou ilusão.

A função fundamental da fantasia é a de tentar nos afastar dos medos e ansiedades que sentimos, criando uma realidade alternativa. Mas o que acontece é que o medo é apenas enterrado mais fundo... A função fundamental do Evangelho, que é na verdade o único fundamento, é a de expulsar o medo, de arrancá-lo com suas raízes, para que possamos ir cada vez mais fundo dentro de um coração sem medo e lá encontrarmos o amor mais profundo. Assim, o maior presente que podemos compartilhar com o mundo é a nossa experiência da realidade.


Dom John Main, OSB



Fonte: "A irrealidade do medo" - Leitura de 30/11/2008
THE HEART OF CREATION (New York: Continuum; 1998), pp. 24-25
Tradução de Roldano Giuntoli
Via: Comunidade Mundial de Meditação Cristã - www.wccm.com.br
Fonte da Gravura: Grev Kafi (the pseudonym of two symbolist painters, Evdokia Fidel'skaya and Grigoriy Kabachnyi, a married couple, that work in co-authorship)
http://www.grevkafi.org

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