A maioria pensa que inteligência é o resultado da aquisição de conhecimento, informação, experiência. Por ter grande soma de conhecimento e experiência, acreditamos ser capazes de fazer face à vida com inteligência. Mas a vida é uma coisa extraordinária, nunca é estacionária; como o rio, está fluindo constantemente, nunca para. Achamos que por amontoar mais experiência, mais conhecimento, mais virtude, mais riqueza, mais possessões, seremos inteligentes. Por isso, respeitamos as pessoas que acumularam conhecimento, os eruditos, e bem assim as que são ricas e cheias de experiência. Mas será a inteligência o resultado de “mais” disso ou “mais” daquilo? O que é que está por trás deste processo de adquirir mais, de desejar mais? Ao desejar mais, estamos às voltas com acumulação, não estamos?
Ora, o que acontece quando se acumulou conhecimento, experiência? Qualquer outra experiência que vocês tenham é imediatamente traduzida em termos de “mais e mais”, e vocês nunca estão realmente experimentando, mas estão sempre amontoando; e esse amontoar é o processo da mente, que é o centro do “mais e mais”. O “mais e mais” é o “eu”, o ego, a entidade encerrada em si mesma que só está preocupada em acumular, seja negativa ou positivamente. Assim sendo, com sua experiência acumulada, a mente se defronta com a vida. Ao defrontar-se com a vida, com esse acúmulo de experiência, a mente ainda está buscando “mais e mais”, de modo que nunca experimenta, só acumula. Enquanto a mente for apenas um instrumento de acumulação, não haverá verdadeira experimentação. Como podem vocês franquear-se à experiência quando estão sempre pensando em obter algo dessa experiência, em adquirir alguma coisa mais?
Por isso, o homem que está acumulando, amealhando, o que está desejando mais, nunca está experimentando a vida em primeira mão. É só quando a mente não está preocupada com o “mais e mais”, com acumular, que há a possibilidade de ser inteligente. Quando a mente está preocupada com o “mais e mais”, toda experiência ulterior fortifica a muralha do “eu” encerrado em si mesmo, o processo egocêntrico que é o centro de todo conflito. Façam o favor de acompanhar isto. Vocês acham que a experiência liberta a mente, mas ela não o faz. Enquanto a sua mente estiver afeta à acumulação, ao “cada vez mais”, toda experiência que tiverem apenas os fortifica em seu egocentrismo, em seu egoísmo, em seu processo fechado de pensar.
A inteligência só é possível quando há liberdade real em relação ao ego, em relação ao “eu”, isto é, quando a mente já não seja o centro da busca de “mais e mais”; quando ela já não está subjugada pelo desejo de experiência maior, mais vasta, mais expansiva. Inteligência é a liberdade em relação à pressão do tempo, não é? Porque o “cada vez mais” implica tempo, e enquanto a mente for o centro da busca de “mais e mais”, ela será o resultado do tempo. Por isso o cultivo do “cada vez mais” não é a inteligência. A compreensão de todo esse processo é o autoconhecimento. Quando alguém se conhece tal como é, sem um centro acumulador, desse autoconhecer provém a inteligência capaz de fazer face à vida; e essa inteligência é criativa.
Examinem suas próprias vidas. Considerem como são tediosas, estúpidas, estreitas, porque vocês não são criativos... Suas vidas estão cercadas de medo, e por isso há autoridade e imitação. Vocês não sabem o que é ser criativo. Por criatividade não entendo o pintar quadros, escrever poemas ou saber cantar. Refiro-me à natureza mais profunda da criatividade que, uma vez descoberta, é uma fonte eterna, uma corrente imorredoura; e ela só pode ser encontrada mediante a inteligência. Essa fonte é o intemporal; mas a mente não pode encontrar o intemporal enquanto for o centro do “eu”, do ego, da entidade que está eternamente pedindo “mais”.
Quando vocês compreenderem tudo isto, não só verbalmente, mas em profundidade, descobrirão que com a inteligência desperta ocorre uma criatividade que é realidade, que é Deus, coisa sobre a qual não se pode especular nem meditar. Vocês nunca chegarão a isso mediante... suas preces por “mais e mais” ou por escapar do “mais e mais”. Essa realidade só pode ocorrer quando vocês entenderem o estado de sua própria mente, a malícia, a inveja, as reações complexas, à medida que surgem, de momento a momento, cotidianamente. Ao entender essas coisas experimenta-se um estado que se pode chamar de amor. Esse amor é inteligência, e produz uma criatividade que é intemporal.
J. Krishnamurti
Fonte: do livro "O Verdadeiro Objetivo da Vida", Ed. Cultrix, SP (texto adaptado)
Fonte da Gravura: Acervo de autoria pessoal
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