domingo, 6 de setembro de 2020

SOBRE A GRAÇA


Saudações nas quatro pontas do Sagrado Quaternário!

Muitos buscadores incautos confundem espiritualidade com paranormalidade – não anseiam por uma radical Transformação e Regeneração de suas Vontades, mas por espécies de fantasia onírica, de transes passivos e estimulações hipnagógicas, respirando vapores cadavéricos naquelas regiões em que “cada flor traz uma serpente enrolada” (como disse uma grande Adepta).

Querido Irmão, não se embriague.

Carne sutil ainda é carne, e não confunda os “anjos de luz” que a ti se apresentam – cheios do brilho fascinador da serpente astral – com a luz UNA E PURA do ILIMITADO. Caro buscador, as notas musicais mais altas (como as frequências emitidas pela música das esferas) são perfeitamente inaudíveis, tais como são imperceptíveis as ondas eletromagnéticas elevadíssimas que nos atravessam acima da luz visível. De maneira análoga, a LUZ ILIMITADA do PAI se apresenta a nós como um RAIO DE TREVA*... A Sabedoria do Incriado de tal maneira excede a nossa que, a infinita sabedoria criatural (das criaturas), em comparação com esta, ainda estaria mais próxima da ignorância infinita do que de apreender minimamente algo deste Fogo Eterno Incognoscível.

Com outras palavras, estimado buscador, não tome pelo Reino Celeste aquilo que não passa de uma inebriante sombra espelhada por nosso próprio psiquismo. O que não quer dizer, todavia, que devemos desprezá-lo, mas apenas colocá-lo em seu devido lugar. Se olharmos para estas sombras tais como realmente são, como para o reflexo da lua na água – isto é, sabendo não estar a lua ali submersa – então já não cometeremos o mesmo Erro de Narciso.

Há três séculos atrás, querido Irmão, a Hierarquia legou a Homens de Vontade operações e ritos por meio dos quais poderiam engendrar o Organismo Espiritual em si e receber progressivas confirmações do andamento de sua realização. A princípio, nossos Irmãos Maiores, mui louváveis agentes intermediários, deram-nos o Fenômeno como sinal de êxito, para que seguíssemos de regeneração em regeneração, de glória em glória, com Desejo e Perseverança. Entretanto, encantados como somos pela FORMA, tomamos a IMAGEM DA COISA pela coisa mesma, e o que antes nos instigava a perseverar na Senda tornou-se a própria coisa buscada, e foi quando nossos antigos irmãos prevaricaram e caíram nas garras da SERPENTE SIDERAL.

Acusado de desertor, foi nosso mestre LOUIS-CLAUDE DE SAINT-MARTIN quem tentou avisá-los do perigo das artes supracitadas. Na época, nossos irmãos equivocados continuaram tão afoitos por suas visões e fenômenos que, perdendo contato com o adepto que os havia instruído, entregaram-se desregradamente às mais variadas experimentações com aquelas regiões sobre as quais o inimigo tem pleno domínio, e passaram a respirar os ares nervosos e éteres exaltados de damas histéricas em salas fechadas sob o império do sonho.

Queridos Irmãos – existe, de fato, o sobrenatural. Do latim SUPER (superior) NATURALIS (natureza), o termo em seu sentido puro refere-se a essa realidade invisível que transcende e engloba nossas existências particulares. Porém, da mesma maneira que precisamos de um organismo NATURAL para experimentar a realidade fenomênica com nossos sentidos, também necessitamos de um ORGANISMO SOBRENATURAL para tornarmo-nos receptivos aos Dons e Inteligências do Espírito, através dos quais algo de divino poderá se fazer ouvir e realizar em nós.

Assim como realizamos atos desta natureza (dormir, comer, andar) com nosso organismo natural, também o exercício de certas faculdades está intrinsecamente relacionado a nosso Organismo Espiritual – podemos citar, dentre estas, a Vontade, a Sabedoria, a Imaginação (Imaginatio), a Vida Moral, entre outras Atividades que abrem as portas superiores para o Invisível em nós. Todavia, da mesma forma que nosso Organismo Natural tem de ser gerado (como o é por nossos progenitores) e alimentado por nutrientes de sua própria natureza (alimentos materiais), esta Nova Alma também necessita de um Engendramento e de uma mui específica Alimentação.

Nosso Coração, de maneira análoga ao Óvulo, deve também estar fertilizado por nosso anseio incessante pela Regeneração, e devemos desejar ardentemente a fecundação pelo Espírito Santo. Uma vez gerado, este recém-nascido em nós necessita de um alimento muito especial, do qual a Hierarquia nos legou como símbolo os Sacramentos. É um processo análogo ao da Eucaristia, e por ela muito bem representado na sombra da matéria, mas que realizar-se-á no Invisível.

Meu Companheiro e Irmão, uma vez nascida em nós esta “Criança do Reino do Céu”, e só finalmente então, poderemos exercer plenamente nossas Faculdades e Potências, Virtudes e Dons Originais livres do brilho fulgurante da joia do príncipe deste mundo. Ao contrário do que esperávamos, quando isso acontecer não necessitaremos mais de buscar ver coisas divinas e astrais com nossos olhos humanos, porque já encontraremos suficiente e infinita Graça e Contemplação em olhar as próprias coisas humanas e mundanas com nossos novos olhos assim divinizados. Sim, pois da mesma forma que um cão vive meio a tantos carros, sons, sinais, gente e palavras que não compreende (e, não obstante o absurdo disto cercá-lo, continua a ocupar-se de farejar e procurar comida), é apenas com o nascimento do Novo Homem que descobrimos, então, quão mortos e adormecidos estávamos espiritualmente. Com a Mente de Compaixão que engendramos em nós, o antigo reino samsárico, dialético e binário, dominado pela divisão e pelas Forças Gêmeas, transfigurar-se-á diante de nós em um verdadeiro Plano Divino, uma Unidade Absoluta onde não há conflitos e nem particulares, senão um único e mesmo Soneto Eterno manifestando-se através de todas as coisas e todos os seres para a Glória da Reintegração Universal.

Estaremos salvos, querido candidato, não por sermos privilegiados, seletos ou muito menos “Cavaleiros Eleitos”, mas por simplesmente termos despertado para este Campo Uno e Oniabarcante, com os olhos do qual podemos nos compadecer profundamente de todos os nossos Irmãos Equivocados que sofrem e causam sofrimento por sua própria ignorância e egoidade. Saibamos ouvir Deus, que nos fala sempre. Nutrindo e defendendo incessantemente nossa Cidade Santa, reconheceremos cada vez melhor as consolações e movimentos deliciosos do Invisível, a graça dosada e santificante que nos será concedida – não para fugirmos do mundo e da vida rumo a um Astral Pseudoceleste – mas para participarmos da Vida Divina aqui e agora, como Agentes, servindo e realizando aquilo que é da Vontade do Espírito em nós. Inferno era apenas estar cego para a Contemplação de Deus. E, assim como o sol doa amorosamente sua luz e calor para todos os planetas que o rodeiam, esperaremos esperançosamente sermos sóis para nós mesmos e para os outros, exemplos vivos da Lei do Amor, aquecidos não pelo Fogo Colérico da Impiedade, mas pela Luz Doce e Amorosa do Espírito Santo que há de fazer morada em nós.

Pelo divino quaternário: Amor-Vontade-Sabedoria-Atividade,
Que as rosas floresçam em vossa cruz!


Fraternidade Martinista


* Vide texto neste blog, do dia 06 de setembro de 2020, supra publicado, com o título: Iluminação Pelo Caminho das Trevas.


Fonte: https://fraternidademartinista.wordpress.com/author/fraternidademartinista/
Fonte da Gravura: https://fraternidademartinista.files.wordpress.com/2019/04/sobre-a-grac387a.jpg?w=660

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